São Paulo, quinta-feira, 15 de janeiro de 2004
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VALE A PENA SABER

MATEMÁTICA

A partilha prevista em um testamento muito curioso

JOSÉ LUIZ PASTORE MELLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Em certa ocasião, um abastado advogado deixou de herança para os seus três filhos uma frota de 11 automóveis, todos de mesmo valor. Além dos carros, o advogado deixou um testamento dizendo que o filho mais velho deveria receber metade da frota, o do meio receberia um quarto e o caçula, um sexto dos carros.
Na hora de fazer a partilha, a confusão se estabeleceu entre os irmãos, já que 11 carros não podem ser divididos de forma exata por dois, quatro e seis, como previa o testamento. Um matemático encontrou a solução.
Emprestando o seu próprio carro aos três irmãos, o matemático disse: "Agora que vocês possuem 12 carros para a partilha, o irmão mais velho receberá seis carros, que é a metade do total; o do meio, três carros, que é a quarta parte do total, e o caçula, dois, que é um sexto do total". Ele ainda afirmou: "Somando os carros que cada um receberá, temos um total de 11, sobrando um veículo dos 12, que, por acaso, é o meu. Devolvam o carro que me pertence e a partilha estará feita corretamente, segundo o desejo de seu pai".
Os irmãos seguiram a recomendação do matemático e pediram que ele esclarecesse o paradoxo.
Disse o matemático: "Muito simples, meus jovens. Seu estimado pai cometeu um deslize ao estabelecer a partilha da herança em 1/2, 1/4 e 1/6, já que a soma dessas frações não totaliza 1. Se, hipoteticamente, pudéssemos cortar os carros para fazer a repartição, cada irmão receberia 11/2, 11/4 e 11/ 6, sobrando ainda 11/12 de um carro. O que eu propus, por meio da estratégia de emprestar o meu carro para a partilha, foi a distribuição de 11/12 entre vocês, cabendo 6/12 ao mais velho, 3/12 ao do meio e 2/12 ao caçula. A soma dessas frações é 11/12 e, como cada herdeiro passará, com elas, a receber um número inteiro de carros, não se torna necessário "cortar" os automóveis, e eu ainda recebo o meu de volta".
Variantes do problema do testamento podem ser criadas da seguinte forma: se houver n carros e as três frações da partilha forem 1/a, 1/b e 1/c, sempre teremos um paradoxo semelhante ao analisado se a equação [n/(n+1)]=(1/ a)+(1/b)+(1/c) tiver uma solução constituída por números inteiros positivos a, b e c. Por exemplo, para n=17, a=2, b=3 e c=9, temos 17 carros e uma partilha em metade, terço e nono, o que produz um novo paradoxo do testamento.


José Luiz Pastore Mello é licenciado em matemática e mestrando em educação pela USP.
E-mail: jlpmello@uol.com.br


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