JOSÉ LUIZ PASTORE MELLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Em certa ocasião, o saudoso professor Albano me contou uma curiosa situação matemática de repartição de herança em que esteve envolvido. Após a morte de seu pai, coube a ele e a um irmão uma pequena fazenda. As terras valiam muito pouco, a não ser pelos mais de mil coqueiros plantados aleatoriamente ao longo do terreno, como ilustra a figura 1.
Desiludido com o valor das terras, mas encantado com o coqueiral, Albano propôs que o terreno fosse dividido por uma linha reta de tal forma que coubesse a cada um exatamente a metade do número de coqueiros. O irmão gostou da idéia, mas duvidou de que tal reta pudesse existir, dada a aleatoriedade da distribuição dos coqueiros no terreno. Foi então que a matemática de Albano entrou em ação.
Para convencer o irmão, ele utilizou, sem perda de generalidade, um exemplo simplificado de terreno com apenas seis coqueiros, representados por pontos na figura 2. Após traçar todas as retas que passavam por dois pontos quaisquer, Albano marcou um ponto P que ficasse fora do terreno e não pertencesse a nenhuma das retas. É fácil perceber intuitivamente que um ponto com tais propriedades sempre existirá, mesmo que o terreno tenha um número muito grande de coqueiros. Em seguida, traçou uma reta r passando por P.
Se rotacionarmos r com centro de rotação em P e no sentido anti-horário, qualquer que seja a sua posição, ela jamais irá conter dois ou mais dos seis pontos marcados inicialmente (tente descobrir o porquê dessa conclusão). Basta então rotacionarmos r até que ela passe exatamente pela metade dos pontos e teremos uma reta que resolve o problema.
Quando perguntei ao professor se a divisão foi feita dessa forma, ele me respondeu: "Não, não..., isso daria muito trabalho! Mas, pelo menos, nossa noite de sono foi bem tranqüila sabendo que tal reta existe".