São Paulo, terça-feira, 27 de maio de 2008
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DEU NA MÍDIA

Autonomia de Santa Cruz divide a Bolívia

ROBERTO CANDELORI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Num enfrentamento que se intensificou após a posse de Evo Morales (2006), o movimento autonomista do departamento (Estado) de Santa Cruz foi às urnas em 4 de maio para votar sobre o Estatuto de Autonomia.
Esse estatuto prevê uma maior independência do departamento de Santa Cruz em relação ao governo central de La Paz. Entre as propostas de mudança, destaca-se o direito de arrecadar impostos, a criação de uma polícia regional e a formação de uma Assembléia Legislativa, cujos membros serão eleitos pelo voto popular.
Porta-voz dos departamentos da chamada "meia-lua" (junto com Tarija, Beni e Pando), Santa Cruz, com uma população de cerca de 2,5 milhões de habitantes, responde hoje por mais de 30% do PIB do país. Seu território possui 40% das terras cultiváveis e suas exportações representam mais da metade do total do país. São números expressivos que qualificam o Estado de Santa Cruz como o mais próspero da Bolívia, razão pela qual reclama mais poder político.
Esse movimento, que muitos definem como separatista, expõe uma fratura social que coloca em risco a unidade da Bolívia. De um lado, um país rico e próspero do "oriente", que engloba a província de Santa Cruz. Do outro, no "ocidente" (La Paz, Oruro e Potosi), um país pobre que concentra as suas atividades produtivas na mineração e no cultivo da folha de coca. Nessa região está concentrada a maior parte dos povos indígenas (quéchuas e aimarás), cujo maior representante é o presidente aimará Morales, o primeiro indígena a comandar o país.
De acordo com a CNE (Corte Nacional Eleitoral), embora o resultado tenha favorecido os autonomistas -85,6% dos votos válidos-, o referendo é ilegal. Segundo a Constituição em vigor, as províncias não têm autoridade para convocá-lo.
Trata-se, portanto, de uma forma de pressão sobre o governo de La Paz, num momento em que o país se prepara para referendar a nova Constituição, aprovada em dezembro de 2007.
Para os autonomistas, trata-se de um documento baseado no socialismo marxista, na ampliação dos direitos indígenas, aprovado sem a presença da oposição e, portanto, sem legitimidade. Na visão de Morales e dos membros do seu partido, o MAS (Movimento ao Socialismo), a nova carta representa um marco histórico.
Inaugura uma nova era na trajetória do país, pois, ao determinar a inclusão social dos grupos indígenas, finalmente materializa uma reparação histórica com aqueles que foram colocados à margem nos 500 anos de história da Bolívia, desde a chegada dos espanhóis.


ROBERTO CANDELORI é professor do colégio Móbile
rcandelori@uol.com.br


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