São Paulo, quinta-feira, 28 de outubro de 2004
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VALE A PENA SABER

MATEMÁTICA


O dia em que o pi virou decreto

JOSÉ LUIZ PASTORE MELLO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Um dos números mais fascinantes estudados pelo homem desde a Antigüidade é o pi. Por mais estranho que pareça, seja qual for o tamanho de uma circunferência, a razão entre o seu comprimento e o diâmetro será sempre o mesmo número que, desde o século 18, vem sendo denotado por pi.
Aproximações do número são conhecidas desde a Antigüidade e, curiosamente, até mesmo no Antigo Testamento há uma passagem da qual se pode deduzir o uso da aproximação pi=3 (Livro dos Reis).
A rigor, os primeiros esforços na matemática ocidental para uma determinação mais rigorosa do valor de pi se devem a Arquimedes, que, por meio do método de exaustão, determinou corretamente até a quarta casa decimal (3,1415). Tal método consistia em calcular aproximações de por meio do perímetro de polígonos regulares inscritos e circunscritos a uma circunferência.
Apesar dos inúmeros indícios de que pi seria um número irracional, ou seja, um número que não pode ser representado por meio do quociente de dois inteiros, apenas em 1770 isso foi definitivamente demonstrado nos trabalhos independentes dos matemáticos Lambert e Legendre.
Admitindo tal fato, ao determinarmos por meio da razão entre o comprimento C de uma circunferência e seu diâmetro D, segue que C e D não podem ser ambos números racionais.
Dos vários capítulos da história do número pi, certamente o mais pitoresco ocorreu em 1897, nos Estados Unidos. Na ocasião, um cidadão chamado Edwin Goodwin encaminhou à Câmara de Representantes do Estado de Indiana o projeto nš 246, que estabeleceria, por decreto, pi=4.
Goodwin baseava-se no seguinte argumento: se um círculo de comprimento C e raio r tiver área igual à de um quadrado de lado 1/4C, segue que pir2=1/42r2, ou seja, que pi=4. Goodwin dizia ainda que o Estado de Indiana teria grandes vantagens em ser o primeiro a decretar pi=4, já que ele permitiria a publicação da descoberta nos livros escolares do Estado com isenção de direitos autorais, que só seriam pagos nos demais Estados americanos.
Após aprovado por unanimidade em primeira instância, o projeto só foi arquivado por ter caído nas mãos de C. A. Waldo, um matemático que, por acaso, estava presente ao Congresso e se dispôs a explicar aos deputados o raciocínio absurdo de Goodwin.
Ufa, dessa estamos livres. Já pensou se tivéssemos de colocar na pauta de negociações da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) o valor de pi=4?
Agora é a sua vez. Encontre o erro na demonstração de Goodwin.


José Luiz Pastore Mello é mestre em ensino de matemática pela USP e professor do Colégio Santa Cruz. E-mail: jlpmello@uol.com.br


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