São Paulo, domingo, 01 de fevereiro de 2004

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ARTES PLÁSTICAS

Exposições de grande porte, inauguradas por conta das comemorações dos 450 anos da cidade, tecem interrelações por acaso

Em SP, modernos colocam os pés na África

ALEXANDRA MORAES
DA REDAÇÃO

LUCRECIA ZAPPI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

O cubismo brotou diretamente da arte africana? Em 1907, ano da aparição do cubismo, as máscaras africanas encobriam os rostos das "Senhoritas de Avignon" de Pablo Picasso.
Na ruptura com a tradição naturalista no final do século 19, a busca por novas formas de representação do mundo já se espelhava na ida de Gauguin para a Micronésia. "Picasso e os expressionistas alemães viram esses objetos, em Berlim e em Paris, que para eles eram arte primitiva, religiosa e mágica. O que Picasso entendeu era a liberdade da forma, o que não havia na Europa nessa época", diz Peter Junge, curador da exposição "Arte da África", que está no CCBB de São Paulo.
A fragmentação do espaço e a busca por formas mais simples, seja no conteúdo formal ou no conteúdo simbólico, já estavam sendo pesquisadas por Paul Cézanne, o que, invariavelmente, abriu os olhos de Picasso, que o chamava de "meu único mestre".
Picasso, ao ser perguntado sobre a influência da arte negra em sua obra, disse, em 1923: "Sempre falam da influência da arte negra sobre mim. O que fazer? Todos nós amamos os fetiches. Van Gogh disse: "Nós fomos influenciados pela arte japonesa". Conosco, são os negros. As formas africanas não tiveram mais influência em mim que sobre Matisse. Ou sobre Derain. Mas, para os africanos, as máscaras eram esculturas como qualquer outra".
Seja como for, a discussão sobre como Picasso e os modernistas se apropriaram da arte africana parece não ter fim. "Alguns dizem que Picasso resgatou algumas idéias dessa arte, outros dizem que ele simplesmente a copiou. Eu acho que é um pouco dos dois", diz Junge.
Também no Brasil a arte da África influenciou o modernismo. "Anita Malfatti tem quadros com forte influência africana: as montanhas, muitas figuras de negro. Os modernistas tiveram uma influência forte da cultura ioruba, através da tribo nagô no Brasil", explica Paulo Figueiredo, colecionador de arte.
A modernista é tema de uma retrospectiva que esteve na enxurrada de exposições por conta do aniversário de São Paulo. Além de "Referencial Anita Malfatti", as exposições dedicadas a Pablo Picasso, à arte africana e a José Clemente Orozco se destacam por se tratar de grandes e abrangentes mostras.
Para o crítico de arte Tadeu Chiarelli, todas elas são "imperdíveis". Já a crítica Lisette Lagnado diz que "gostou muito" da mostra de Orozco e que "Arte da África" lhe provocou mais curiosidade. "Acho que nossa ligação com esse outro continente sempre foi mais explorada na música e na dança do que nas artes plásticas", diz.
O formato de megaexposição é freqüente alvo de críticas, principalmente em Bienais, mas, para Chiarelli e Lagnado, não chega a ser nocivo. "Esse tipo de exposição é importante quando bem elaborado e voltado para a transmissão do conhecimento sobre a arte", pondera Chiarelli. "Tenho achado excelente ver grandes exposições de artistas brasileiros que podem usufruir hoje de uma estrutura profissional de divulgação e monitoria", diz Lagnado.


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