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CINEMA
Nando Olival e Fernando Meirelles dirigem adaptação da peça de Renata Melo, que mantém elenco
"Doméstica" vira filme experimental
especial para a Folha
A certa altura do enredo da peça
"Domésticas", de Renata Melo,
uma das criadas limpa um pigarro imaginário e vocifera, sem comedimento, essa constatação: "A
gente passa, eles amassa (sic); a
gente limpa, eles suja; parece um
trato que a gente faz". A variante
moderna, brasileira, desse contrato social (como o chamaria Rosseau) que põe à parte criadas e patroas vai às telas de cinema.
Nando Olival e Fernando Meirelles, da O2 Filmes, uma das mais
bem-sucedidas produtoras paulistanas (leia texto ao lado), são os
diretores da empreitada, "Na verdade um filme despretensioso e
um tanto experimental", no dizer
de Meirelles.
Despretensioso porque o orçamento é baixo (cerca de R$ 900
mil) e a abordagem é lisa, sem
aquele tom de denúncia à moda
Bertrand Tavernier ("Quando
Tudo Começa"), sem preocupações sociológicas ou coisa parecida (bem à moda do cinema brasileiro dos anos 90, tirando do caldeirão diretores como Eduardo
Coutinho, de "Santo Forte").
Experimental porque, por conta
da despretensão, o filme vai trazer, no meio de seu ficcionismo,
laivos documentais e um tanto
poéticos, pois colhidos de histórias individuais acontecidas de fato (a peça foi escrita a partir de depoimentos coletados durante três
anos, junto a algumas das três milhões de empregadas domésticas
que há no Brasil, por Renata Melo).
Na quinta-feira da semana passada a Folha acompanhou um
dos últimos dias de filmagens de
"Domésticas" (hoje é o derradeiro). O set foi montado numa empresa de serviços de motoboy na
Vila Madalena, em São Paulo, onde Meirelles e Olival comentaram
o projeto, que tem Eduardo Escorel na direção de fotografia e a
própria Renata Melo, além do
elenco da peça "Domésticas", como protagonistas.
"Na verdade, o filme deveria estar pronto no ano passado, quando filmamos por três semanas,
em fevereiro e março. Mas montamos o filme e percebemos que o
roteiro estava um tanto disperso,
sem amarração. Decidimos
amarrar isso melhor e esclarecer
um pouco mais a história. Então
fomos atrás de recursos para filmar um pouco mais, nove dias
mais de filmagens", contou Meirelles.
É um procedimento incomum
montar o filme e depois retocá-lo,
mexer no roteiro e ajustá-lo depois que o grosso foi feito. "Isso
só foi possível por causa da estrutura da O2, lá temos tudo, dá pra
ver o material, montá-lo etc."
Olival adianta que o essencial
da peça de Renata Melo estará no
filme. "Há pelo menos 20 mulheres que trabalham realmente como empregadas domésticas participando do filme, eram essas
histórias pessoais que precisávamos esclarecer melhor para o espectador", diz.
"Tem a empregada que vê a filha fugir com um cantor de rap e
passa o filme todo procurando-a,
preocupada. Tem também a doméstica que casou e vê seu marido rejeitá-la sexualmente, ele não
quer transar com ela. Ou seja, são
histórias e desencontros que independem da condição social,
acontecem com qualquer um",
diz Meirelles.
O filme deverá estar pronto no
final de maio. A estréia é uma incógnita. "Outro dia li que há 16 filmes brasileiros esperando para
entrar em cartaz. Teremos que
pegar nossa senha", ironiza Meirelles. "No Brasil, fazem salas e
mais salas, mas os Multiplex, só
querem saber de passar filme
americano", conclui o diretor.Seu
próximo longa será "Cidade de
Deus", baseado no livro homônimo de Paulo Lins.
(CRISTIAN AVELLO CANCINO)
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