São Paulo, quarta-feira, 01 de março de 2000


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CINEMA
Nando Olival e Fernando Meirelles dirigem adaptação da peça de Renata Melo, que mantém elenco
"Doméstica" vira filme experimental


especial para a Folha

A certa altura do enredo da peça "Domésticas", de Renata Melo, uma das criadas limpa um pigarro imaginário e vocifera, sem comedimento, essa constatação: "A gente passa, eles amassa (sic); a gente limpa, eles suja; parece um trato que a gente faz". A variante moderna, brasileira, desse contrato social (como o chamaria Rosseau) que põe à parte criadas e patroas vai às telas de cinema.
Nando Olival e Fernando Meirelles, da O2 Filmes, uma das mais bem-sucedidas produtoras paulistanas (leia texto ao lado), são os diretores da empreitada, "Na verdade um filme despretensioso e um tanto experimental", no dizer de Meirelles.
Despretensioso porque o orçamento é baixo (cerca de R$ 900 mil) e a abordagem é lisa, sem aquele tom de denúncia à moda Bertrand Tavernier ("Quando Tudo Começa"), sem preocupações sociológicas ou coisa parecida (bem à moda do cinema brasileiro dos anos 90, tirando do caldeirão diretores como Eduardo Coutinho, de "Santo Forte").
Experimental porque, por conta da despretensão, o filme vai trazer, no meio de seu ficcionismo, laivos documentais e um tanto poéticos, pois colhidos de histórias individuais acontecidas de fato (a peça foi escrita a partir de depoimentos coletados durante três anos, junto a algumas das três milhões de empregadas domésticas que há no Brasil, por Renata Melo).
Na quinta-feira da semana passada a Folha acompanhou um dos últimos dias de filmagens de "Domésticas" (hoje é o derradeiro). O set foi montado numa empresa de serviços de motoboy na Vila Madalena, em São Paulo, onde Meirelles e Olival comentaram o projeto, que tem Eduardo Escorel na direção de fotografia e a própria Renata Melo, além do elenco da peça "Domésticas", como protagonistas.
"Na verdade, o filme deveria estar pronto no ano passado, quando filmamos por três semanas, em fevereiro e março. Mas montamos o filme e percebemos que o roteiro estava um tanto disperso, sem amarração. Decidimos amarrar isso melhor e esclarecer um pouco mais a história. Então fomos atrás de recursos para filmar um pouco mais, nove dias mais de filmagens", contou Meirelles.
É um procedimento incomum montar o filme e depois retocá-lo, mexer no roteiro e ajustá-lo depois que o grosso foi feito. "Isso só foi possível por causa da estrutura da O2, lá temos tudo, dá pra ver o material, montá-lo etc."
Olival adianta que o essencial da peça de Renata Melo estará no filme. "Há pelo menos 20 mulheres que trabalham realmente como empregadas domésticas participando do filme, eram essas histórias pessoais que precisávamos esclarecer melhor para o espectador", diz.
"Tem a empregada que vê a filha fugir com um cantor de rap e passa o filme todo procurando-a, preocupada. Tem também a doméstica que casou e vê seu marido rejeitá-la sexualmente, ele não quer transar com ela. Ou seja, são histórias e desencontros que independem da condição social, acontecem com qualquer um", diz Meirelles.
O filme deverá estar pronto no final de maio. A estréia é uma incógnita. "Outro dia li que há 16 filmes brasileiros esperando para entrar em cartaz. Teremos que pegar nossa senha", ironiza Meirelles. "No Brasil, fazem salas e mais salas, mas os Multiplex, só querem saber de passar filme americano", conclui o diretor.Seu próximo longa será "Cidade de Deus", baseado no livro homônimo de Paulo Lins. (CRISTIAN AVELLO CANCINO)


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