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MULTIMÍDIA
Idéias "dadá" ganham hoje palco em SP
especial para a Folha
Um poema do dadaísta Kurt
Schwitters (1887-1948), publicado nas 32 páginas do número
24 da revista "Merz", é a base
do espetáculo multimídia de
Lucio Agra, pesquisador da
vanguarda, levado, de hoje a
sexta, ao palco do Instituto
Goethe (em SP). A peça une
poemas, animações digitais e
efeitos sonoros eletrônicos.
Lavoisier sutil e brutalista da
arte, biodegradável e impregnada de vida, Schwitters inventou uma poética do detrito. Em
pinturas, óperas e poemas, celebrou "o júbilo do objeto", como expressa Haroldo de Campos em ensaio do livro "A Arte
no Horizonte do Provável".
Schwitters batizou sua arte de
"Merz" (resto subversivo de
"Kommerz", pedaço de anúncio colado numa obra) e, reciclando bricabraque do lixo e
cacos do cotidiano (bilhetes de
bonde, carimbos, barbantes),
bolou quadros Merz, poesia
Merz e até "eu mesmo, atualmente, me chamo Merz", declarou em 1928.
Com resíduos de frases feitas,
clichês e normas de etiqueta,
criou "colagens verbais" numa
linguagem de despojos e dejetos de signos. Da pré-palavra
ao ouvido, passou à "optofonética", pintura escrita do som
original. Hans Arp encantou-se
com Schwitters recitando a
"Sonata Pré-Silábica".
A pesquisa de Schwitters sobre a emanação do vocábulo
primitivo durou de 1922 a 1932
e culminou na "Ursonate - Sonata Primordial", na tradução
de Haroldo de Campos, que
inspira a peça que estréia hoje.
Mesmo entre os dadaístas, a
experiência (cuja fonte foi a tipografia de Raoul Hausmann)
soou controversa, acusada de
corromper o poema sonorista
numa forma antiga.
Mas Schwitters lançava dados fecundos para um jogo básico da arte contemporânea:
ordem x caos. Os blocos de ruídos e sons ancestrais são organizados em timbres e durações,
uma das matrizes da música
concreta de Pierre Schaeffer e
Karlheinz Stockhausen.
Bricolagem de Dadá e Bauhaus, vovô alemão de Hélio Oiticica e irmão atrevido de Duchamp, Schwitters cultivou o
gosto pelo construtivismo russo e o neoplasticismo holandês
como filtro de rigor contra o
desbragado vale-tudo que poderia tragar o objeto tornado
arte. Ver e ouvir sua "Ursonate
- Sonata Primordial" é um privilégio que nos dá o presente:
tempo da liberdade de imaginação e prazer de produzir.
(CARLOS ADRIANO)
Espetáculo: Ursonate - Sonata
Primordial
Quando: de hoje a sexta-feira, às 21h
Onde: Instituto Goethe (r. Lisboa,
974, tel. 0/xx/11/280-4288)
Quanto: R$ 10 e R$ 5
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