São Paulo, sexta-feira, 01 de abril de 2005

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CDS

POP

"Guero", disco do cantor americano, é quase todo produzido pelos Dust Brothers

Beck mistura influências e se encontra em seu melhor álbum

DA REPORTAGEM LOCAL

O que está acontecendo, garoto branco? É o que pergunta Beck em "Qué Onda Guero", canção de seu novo álbum.
O garoto passeia pelo bairro assoprando uma estridente corneta, enquanto caubóis dormem na calçada, "manos blancos" tocam "rancheras" em guitarras baratas, "abuelitas" caminham com sacolas plásticas em direção à igreja.
É assim a canção, levada numa mistura de inglês e espanhol. Nonsense, esquisita, nada convencional. É a cara do cantor, é a cara de "Guero", o disco -de longe o melhor que Beck já produziu, e isso não significa pouco.
Beck Hansen, hoje com 34 anos, apareceu em 1994, com o megahit "Loser". Muita coisa mudou na vida do cantor de lá para cá. Assim como Tom Cruise e John Travolta, ele é praticante da cientologia; é casado com a atriz Marissa Ribisi, e o casal tem um filho, Cosimo Henri Hansen. Beck foge da trivialidade.
Em 1996, lançou "Odelay", que, com canções como "Where It's At", marcou época no rock americano. Depois ele se perdeu. Em discos como "Midnite Vultures" (1999; espécie de ode a Prince) e "Sea Change" (2002; melancólico e desordenado), parecia confuso.
Mas, olhando para trás, Beck se encontra. Como todo artista que se preze, ele enfia um monte de influências e referências no disco. "Guero" tem a crueza de "Mellow Gold" (94); o cinismo de "Odelay"; o atrevimento de "Mutations" (98); o funk balançante de "Midnite..."; a aspereza de "Sea Change". Há David Bowie, electro, fábulas tristes, rap, blues... Há de tudo, e mesmo assim "Guero" soa conciso e indispensável.
Liricamente, é um disco nada leve, mórbido. Fala de assassinatos, de morte, de "cavalos perfilados que me carregam para ser enterrado" ("Farewell Ride"). Em "Girl", um azedo Beck ("Eu sei que eu vou roubar os olhos dela") se contrapõe a um alegre electro construído em cima de um teclado tosco (no bom sentido). É a mais surpreendente do disco.
O álbum, quase todo ele, é produzido pelos Dust Brothers, que mexeram também em "Paul's Boutique", dos Beastie Boys. Não surpreende que a primeira faixa do CD, "E-Pro", carregue um sample da nervosa "So Wat'cha Want", dos Beastie Boys.
Já "Missing" traz a paixão de Beck pela música brasileira (seu título anterior era "Brazilica"). Quase chega na bossa, mas pára num downtempo orquestrado. "Earthquake Weather" flerta com o rap em uma batida seca -e tem Money Mark no teclado. "Broken Drum" é climática, densa -não à toa foi remixada pelo inclassificável Boards of Canada.
O amigo Jack White, dos White Stripes, toca baixo na minimalista "Go it Alone" -White não apenas participa, mas dá o caminho para Beck. Faz bela companhia à blueseira "Farewell Ride". Na pop "Hell Yes", até se dá ao luxo de ter Christina Ricci numa participação duvidosa, dizendo "please, enjoy" (por favor, aproveite).
Garoto branco que sonhava em ser Prince, Beck transformou "Guero" em sua obra-prima.
(THIAGO NEY)


Guero
    
Artista: Beck
Lançamento: Universal
Quanto: R$ 35, em média


Texto Anterior: Cinema: Versão para as telas de "Vestido de Noiva" é exibida em evento francês
Próximo Texto: "Everything's OK": Al Green abençoa a alcova dos justos
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.