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"Comprar quadros é uma doença", diz Costantini
de Buenos Aires
O financista argentino Eduardo
Costantini, 53, é um apaixonado
pelas artes. Seus olhos brilham
como os de uma criança que cobiça um brinquedo novo quando
fala dos quadros que gostaria de
possuir.
"É uma doença." Assim ele define sua obsessão por comprar novas obras. Ele calcula que, quando
o Malba abrir suas portas dentro
de um ano, serão 200 e não mais
180 as peças de sua coleção.
Costantini recebeu a Folha no
escritório de sua empresa, a Consultario Inversora, em Buenos Aires, para falar do projeto do museu e de seu lado colecionador.
(VA)
Folha - Como o sr. se tornou
um colecionador?
Eduardo Costantini - Há mais
ou menos 30 anos, eu frequentava
uma sorveteria no bairro onde
morava. Em frente, havia uma galeria. Um dia me senti atraído por
um quadro de Berni. Quis comprar, mas não tinha dinheiro.
Comprei duas obras mais baratas
a prestação e não parei mais.
Folha - Quais foram as obras
mais difíceis de comprar?
Costantini - Um "Candombe"
do Pedro Figari levou cinco anos.
Uma senhora tinha 18 quadros de
Figari e não queria vender esse,
que era o melhor. Eu ligava para
ela todos os anos. Um ano me
chamou e disse que estava disposta a vender. Um que me custa
muito comprar é o "Antropofagia", da Tarsila do Amaral. A dona do quadro não quer me ver pela frente, já insisti muito e ela me
põe para correr.
Folha - E quanto o sr. estaria
disposto a pagar por ele?
Costantini - Esse quadro vale
US$ 3 milhões, no mínimo.
Folha - E como foi a compra do
"Abaporu", da Tarsila?
Costantini - O dono quis vender no Brasil, para que ficasse no
país. Esteve conversando com
empresários e instituições brasileiros que nunca se definiram.
Um dia abri o catálogo de leilões
e apareceu o "Abaporu" à venda.
Não podia acreditar. Foi um presente dos céus. São essas coisas
imprevisíveis que aparecem. Ele é
um ícone da pintura brasileira.
Houve uma disputa com brasileiros no leilão, mas eu estava decidido a ficar com o "Abaporu" e
elevei o preço constantemente.
Para mim, é uma das dez principais obras pintadas neste século
no Brasil.
Folha - Qual foi a obra mais cara que o sr. já comprou?
Costantini - Foi um Diego Rivera que comprei há poucos meses,
custou US$ 3,5 milhões e se chama "Retrato de Ramón Gomez de
la Serna". É o meu primeiro Rivera, e comprei porque o Malba precisava ter um. Esse é uma pintura
fundamental da arte mexicana. O
auto-retrato da Frida Kahlo, que
comprei há cinco anos foi o recorde latino-americano em leilões,
saiu por US$ 3,2 milhões.
Folha - E por que comprar apenas obras latino-americanas?
Costantini - Fico muito tentado
a comprar um Picasso, por exemplo. Mas acho que falta espaço para a pintura latino-americana, e é
preciso promovê-la. Além disso,
há laços afetivos, é uma questão
de integrar-se com suas raízes.
Folha - O sr. está desenvolvendo esse projeto sozinho, sem
ajuda do governo. Como pretende recuperar tanto dinheiro?
Costantini - Esse museu não é
um negócio para mim. Ele me trará outro tipo de satisfação. Será a
casa dos quadros, porque muitos
hoje estão sem-teto, em Nova
York, na Suíça, alguns em museus
outros em depósitos. O "Abaporu" está guardado em Nova York.
Folha - O que ainda falta?
Costantini - Dos brasileiros eu
queria ter Lasar Segall, Volpi, Rego Monteiro, Brecheret, Oiticica.
Falta tanta coisa, nunca termina.
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