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CINEMA/ESTRÉIA
"O CONDE DE MONTE CRISTO"
Nova adaptação do clássico de Alexandre Dumas é prejudicada por tom carregado do elenco
Ação e farsa liberam canastrice dos atores
CRÍTICO DA FOLHA
Foi em busca de uma das primeiras versões mudas de "O
Conde de Monte Cristo", provavelmente a de 1922 (dirigida por
Emmett J. Flynn), e não a de 1913
(co-dirigida por Edwin S. Porter),
memória de sua infância, que o
célebre Henri Langlois iniciou a
coleção que viria a se tornar, em
1936, a Cinemateca Francesa.
A imagem que marcou a infância de Langlois era a da dor muda,
uma pura afecção, do célebre personagem de Alexandre Dumas
(pai), Edmond Dantès, diante da
vil injustiça a que era confrontado. Atraiçoado pelo melhor amigo, o ingênuo Dantès perdia a
inocência para deixar nascer em
seu lugar o desejo de vingança.
A inocência perdida de Dantès e
sua dor inominável pertencem,
elas próprias, à era de afecções do
primeiro cinema, era cujos rastros Langlois tentou recuperar.
Desde então, "O Conde de
Monte Cristo" já rendeu, ao menos, 20 outras versões (só na década de 50 foram seis), inclusive
uma série televisiva (formato que
parece se adequar melhor ao calhamaço de Dumas) brasileira,
"Eu Compro Esta Mulher" (1966).
Dantès continuou inocente,
mas os espectadores e os produtores já não mais: invariavelmente
nas mãos dos americanos, usualmente limitados ao sentido da
ação das histórias que contam, o
clássico de Dumas reduziu-se, cada vez mais esquematicamente, à
encenação do puro desejo de vingança de seu protagonista.
Foi assim que, historicamente,
Dantès transformou-se de fato no
Conde de Monte Cristo, seu alter
ego vingativo. O curioso desta nova versão da história que entra em
cartaz na cidade, a primeira do
novo século, é o ar de superprodução que o filme ganha a partir
do momento em que Dantès
transforma-se no conde.
As duas primeiras sequências
do conde são uma grande festa de
apresentação em Paris e um baile
de Carnaval em Roma. É como se
a maior parte do orçamento da
produção fosse destinada a encenar e celebrar a vingança do conde.
O inusitado da encenação, desse
"grande teatro" dirigido pelo
Conde de Monte Cristo, é que ela
parece acentuar, talvez até propositadamente, a já marcante impostura do elenco, a começar pela
versão canastrona do conde criada pelo ator James Caviezel.
A farsa libera a canastrice dos
atores e quanto mais a adaptação
adere ao novelesco, mais estes escorregam no tom. Não bastasse o
tempo já ter destituído de seu real
sentido a maior parte das palavras
entoadas por eles, palavras que
ecoam temas perdidos do romance, como o conflito entre "sangue" e trabalho (nobreza e burguesia), entre desígnio divino e
ação humana, entre iluminismo e
irracionalismo, que não se fazem
aqui secundários porque datados,
mas para constituir o fundo falso
de um filme cujo único verdadeiro sentido é a ação (de vingança)
por ela mesma.
(TIAGO MATA MACHADO)
O Conde de Monte Cristo
The Count of Monte Cristo
Direção: Kevin Reynolds
Produção: EUA/Reino Unido, 2002
Com: James Caviezel, Guy Pearce
Quando: a partir de hoje nos cines Villa-Lobos, Central Plaza, Continental, Interlagos, Ipiranga e circuito
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