São Paulo, sexta, 1 de maio de 1998

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Gênero virou norma

especial para a Folha

O filme musical talvez seja o cinema em seu estado mais puro - depois, é claro, do filme de vanguarda.
A degeneração do gênero é um processo curioso. O musical americano foi o apogeu da arte como indústria. O estrondoso apelo popular foi ouvido até no Brasil, onde (diapasão parodiado) as chanchadas conquistaram o público.
Após estabelecer a norma por excelência do cinema convencional, foi a música que fecundou as obras mais experimentais e inventivas (a composição musical é a estrutura mesma do filme).
Fischinger pinta diretamente sobre a película, conduzido pela música gravada na banda sonora do filme. Brakhage move sua câmera em arabescos abstratos e faz filmes musicais... mudos. Até é possível criar um musical com meros 11 fotogramas de uma incerta imagem inaugural.
Bressane vê seu "paideuma" dançar sob o desconcerto de sambas ("Tabu"). Caetano (aí é quando músico faz filme) satura a cena de prosa e transborda o canto ("O Cinema Falado"). Omar investiga o signo do suporte sonoro ("O Som ou Tratado de Harmonia"). Reichenbach imanta as coisas com o toque de Scriabin ("Dois Córregos").
Godard rege pintura com música erudita, em compasso de pausas ("Nouvelle Vague") e comete um paradoxo ao fazer um "musical neo-realista" ("Uma Mulher é Uma Mulher"). Straub impregna cada fotograma de som (no filme em que nem um fio de cabelo das perucas de época se move) e faz um musical marxista ("Crônica de Anna Magdalena Bach").
A atualidade do musical reside em sua pertinência nostálgica como gênero histórico e em sua potência deflagradora como autonomia da música. (CA)


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