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LOJA DE HORRORES
Primeiras obras de Cronenberg têm retrospectiva
"Hollywood é corrosiva para a arte", diz diretor
DA REPORTAGEM LOCAL
Além da mostra com objetos de
cenas das produções do cineasta
David Cronenberg, oito filmes do
início de sua carreira serão exibidos no Carlton Arts deste ano. A
seguir, Cronenberg comenta suas
primeiras produções e diz por
que não vai filmar em Hollywood.
(FABIO CYPRIANO)
Folha - O senhor já disse que suas
produções são como pesadelos: impressões terríveis sobre algo banal...
David Cronenberg - Quando
contamos um sonho para alguém, nunca transmitimos a
mesma sensação que tivemos. É
como a vida: por um lado, viver é
simples e natural, mas, por outro,
há sempre um tipo de medo e terror, o que é uma abordagem existencialista para a vida. É o que
busco fazer em minhas obras.
Folha - Um dos filmes que serão
exibidos na mostra é "Calafrios",
de 75, que trata de uma epidemia
transmitida por sexo, bem antes do
início da Aids. Foi premonição?
Cronenberg - Diz-se a mesma
coisa de "A Mosca", que a doença
lá era uma metáfora para a Aids.
Para mim é o inverso. Sempre
houve doenças terríveis que
ameaçaram a humanidade. Mesmo quando não há doença, há o
avanço da idade, a morte. Não há
como escapar. E para mim é uma
coisa bem óbvia a tratar. Mais
uma vez, é a condição humana.
Como um artista, o que tenho a
oferecer é uma espécie de antena,
a habilidade de perceber situações
para as quais nem todo mundo
tem sensibilidade. Por isso, eu
não definiria como premonição,
mas como estar atento para o que
está acontecendo à nossa volta de
forma sensível.
Folha - É uma estratégia tratar do
anormal para falar do normal?
Cronenberg - "Normal" é um
conceito humano, é uma questão
de estatística. Na natureza não há
tal conceito, mas coisas que funcionam e outras que não funcionam. De fato, todos passamos por
mutações, é o processo de evolução. Sem anormalidade não há
evolução, e mesmo ela é normal.
É o que tento discutir.
Folha - Mesmo sendo um dos diretores autorais mais importantes,
o senhor continua longe de Hollywood. Por quê?
Cronenberg - Quantos autores
você acha que existem em Hollywood? Hollywood é um ambiente
muito corrosivo para a arte, mas é
o local correto para quem pretende fazer filmes comerciais. Lá, até
os filmes de pequeno orçamento
têm US$ 10 milhões, um valor que
tenho muita dificuldade em conseguir. Eu resisto em não ir para
Hollywood, quero permanecer
próximo à produção européia.
Meus filmes estão no meio do caminho entre esses dois locais, assim como Toronto, a cidade onde
vivo. Por isso ela é o lugar ideal
para mim.
Folha - Isso é ruim para nós, brasileiros, que recebemos todos os
filmes de Hollywood, mas ainda
não vimos sua mais recente produção, "eXistenZ".
Cronenberg -Não quero culpar
ninguém, mas apesar de o filme
não ter tido sucesso nos EUA, teve
boa repercussão na Europa e o
distribuidor brasileiro poderia
encontrar uma forma de bom
marketing para ele. Se eu fizesse
um filme em Hollywood, com
muito dinheiro e boa distribuição, poderia ser visto no Brasil,
mas fatalmente não seria do meu
agrado.
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