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ARTIGO
Mehler é um marco de integridade artística e humana
CONSUELO DE CASTRO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Miriam Mehler é uma atriz
densa, múltipla, capaz de
fazer comédia e drama com radical qualidade. É uma pessoa que
lê, ouve, busca, conhece o movimento do mundo, escarafuncha e
se entrega ao ver e viver o diferente, o outro.
É também uma mulher sensual,
contida como a lady que sua origem lhe ensinou a ser, mas apaixonada como lhe ensinou o ofício. Uma amiga insubstituível em
sua ternura e capacidade de partilha, leal e generosa mesmo em
tempos de "farinha-pouca-meu
pirão-primeiro", verdadeira no limite da luz.
Tenho por Miriam mais do que
admiração; gratidão, pois foi por
seu voto de confiança que, aos 21
anos, estreei no teatro profissional, com "À Flor da Pele", sob direção do tão querido Flávio Rangel, inaugurando o Paiol que ela
acabara de construir com seu ex-marido, Perry Salles.
E foi também com um texto
meu, "O Grande Amor de Nossas
Vidas", fazendo a difícil Marta,
que ela deixou o Paiol.
Conhecemo-nos anos antes,
numa assembléia da classe, na antecâmara tensa do AI-5. Um belo
dia ela, Luis Gustavo e Plínio Marcos me convidaram para ser contra-regra do espetáculo "Quando
as Máquinas Param", de Plínio,
na temporada carioca. Fui e entrei
no teatro pela porta dos fundos.
Talvez por isso nunca tenha encontrado a saída. Foi no depósito
do teatro Jovem, no Rio, que escrevi -sob a batuta exigente de
Plínio e de Miriam- minha primeira peça, "À Prova de Fogo",
censurada no momento mesmo
de sua escrita.
Foi por encomenda de Miriam
que escrevi "À Flor da Pele" a toque de caixa, para estrear o Paiol.
Foi por sua obstinação que entendi a eternidade oculta sob a fugacidade do ato teatral. Miriam é para mim um marco de integridade
artística e humana, mas, sobretudo, o primeiro capítulo de minha
história profissional como dramaturga. Honra que espero poder
justificar a cada minuto de meu
trabalho.
Merda, Mirinha, hoje e sempre.
E um beijo da tua "Tanquinho"
-de guerra e de paz.
Consuelo de Castro é dramaturga
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