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DANÇA - MEMÓRIA
Sem Robbins, EUA perde essência de uma era
ANA FRANCISCA PONZIO
especial para a Folha
Com a morte de Jerome Robbins, na última quarta-feira, a
dança norte-americana perde sua
personalidade mais importante,
depois de Balanchine. Parceiro de
Balanchine na direção do New
York City Ballet, Robbins destacou-se tanto no balé quanto no
teatro musical.
Grande inovador dos musicais
da Broadway, Robbins coreografou sucessos fenomenais, principalmente entre 1944 e 1964, período em que lançou "On the
Town", "The King and I",
"Gypsy", "Fiddler on the Roof"
e o popular "West Side Story".
Nessa época de ouro, contou
com a colaboração de compositores célebres -entre outros, Irving
Berlin, Leonard Bernstein, Richard Rodgers, Oscar Hammerstein, Stephen Sondheim e Jule
Styne.
"Sinto que ainda tenho um
grande balé dentro de mim", disse Robbins no ano passado, durante os ensaios de sua última
obra, "Brandenburg", sobre os
concertos de Bach, que criou para
o New York City Ballet.
Dois anos antes, a principal
companhia nova-iorquina havia
adquirido os direitos de interpretar a suíte de danças do musical
"West Side Story".
Com suas barbas brancas, que
nos últimos tempos lhe conferiam
um ar de patriarca, Robbins circulava até recentemente pelos bastidores do New York City Ballet, cujos integrantes o tratavam como o
derradeiro mestre.
Depois de quase se casar com a
bailarina Nora Kaye nos anos 50,
Robbins optou pelo celibato. Vivia
sozinho em sua casa em Manhattan, onde morreu depois de ser
hospitalizado no sábado, devido a
um derrame que o levou ao coma.
"Dança é sobre relacionamentos", dizia Robbins, que, a partir
de tal idéia, traçou o perfil americano da dança, em balés que captavam as ressonâncias universais
das emoções humanas.
Segundo Anna Kisselgoff, crítica
de dança do jornal "The New
York Times", que conviveu com
Robbins, o coreógrafo sabia distinguir o espírito de seu tempo.
Mas, diferentemente dos criadores que deram eco à cultura norte-americana, Robbins não fez balés sobre pioneiros e caubóis. "Ele
não se preocupava com o mito da
América, mas com sua realidade.
Soube captar, com genialidade, a
essência de uma era, e isso tornou-se sua assinatura", afirma
Kisselgoff.
Primeiro coreógrafo dos Estados
Unidos a impor um estilo americano ao balé clássico, Robbins jamais se tornou repetitivo, embora
tenha criado um repertório numeroso.
Além de 66 balés, assinou as coreografias de 15 musicais da
Broadway, onde também destacou-se como diretor de espetáculos como "Funny Girl".
Em 1944, quando integrava o
Ballet Theater, que mais tarde se
transformou no American Ballet
Theater, Robbins criou seu primeiro balé, "Fancy Free", em
parceria com um compositor então desconhecido, Leonard Bernstein.
Símbolo de sua época, "Fancy
Free" tem como protagonistas
três marinheiros que interpretam
uma dança sincopada e jovial, ao
som da partitura jazzística de
Bernstein. O cenário é a cidade de
Nova York, durante a Segunda
Guerra Mundial.
Mais tarde, "Fancy Free" foi incorporado ao musical "On the
Town" e hoje integra o repertório
do New York City Ballet, que o
apresenta com frequência.
"Cada balé é um rito poderoso,
que evoca um problema da vida
que não pode ser transmitido em
palavras, descrições ou anedotas,
mas que é completamente compreensível quando expresso unicamente por uma série de movimentos", dizia Robbins.
Para muitos bailarinos, interpretar suas propostas coreográficas
significou o passaporte para o sucesso. Um exemplo é Chita Rivera,
estrela dos musicais americanos
que estreou na Broadway aos 17
anos, em "Call me Madam", a
convite de Robbins.
Mais tarde, o coreógrafo a requisitaria para interpretar Anita em
"West Side Story", que a projetou definitivamente. "Se Jerry me
pede para saltar de um edifício e,
ao tocar o chão, fazer dois passos
para a frente e terminar com uma
flexão de pernas, eu digo OK e executo sem pensar", disse Rivera.
Ao introduzir o balé na Broadway, Robbins fez da dança uma
expressão capaz de sustentar o enredo com o mesmo vigor da música e da palavra falada.
Junto com Balanchine, que o
chamou em 1948 para associar-se
à direção do New York City Ballet,
Robbins contribuiu para elevar a
reputação da companhia. Após a
morte de Balanchine, em 1983, ele
dirigiu o grupo ao lado do bailarino e coreógrafo dinamarquês Peter Martins até 1990.
Nascido na cidade de Nova York
em 11 de outubro de 1918, Jerome
Robbins experimentou o gosto do
sucesso aos três anos de idade,
quando tocou piano em um concerto infantil.
"Cresci dentro da tradição judaica, em que as crianças devem
absorver toda cultura possível",
reconheceu mais tarde.
Na juventude, logo depois de
abandonar a Universidade de Nova York, onde pretendia formar-se
em química, começou a ter aulas
de dança moderna com Gluck
Sandor e Felicia Sorel.
Chamado por Robbins de "guru", Sandor aconselhava seus discípulos a estudar a técnica do balé
clássico em plena década de 30,
quando a dança moderna se impunha nos Estados Unidos.
O estímulo foi fundamental para
Robbins, que se firmou como o
primeiro grande coreógrafo clássico norte-americano, com uma
força de estilo que o tornou equiparável aos nomes mais importantes deste século, como Balanchine,
sir Frederick Ashton e Antony Tudor.
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