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Castorf encena Brecht lírico nos palcos do Brasil
Diretor da companhia alemã Volksbühne inicia turnê por seis cidades do país
"O Teatro é o esporte do pensamento", diz Castorf; "Na Selva das Cidades" será apresentada hoje e amanhã no Sesc Pinheiros, em SP
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
O diretor alemão Frank Castorf age um pouco como os personagens de "Na Selva da Cidade": aprecia dizer não.
Na peça do dramaturgo também alemão Bertolt Brecht
(1898-1956), um bibliotecário
se recusa a "vender" a um negociante a sua opinião negativa
sobre determinado romance.
É o "parti pris" algo surrealista do texto que se revelará mais
complexo nas relações humanas sob os vetores afetivos, políticos e sociais. Isso tanto no
contexto da Chicago de 1912,
centro financeiro em que se
passa a ação original, quanto na
geografia indefinida da releitura de Castorf, que cabe em
qualquer metrópole de 2006.
Em nova passagem pelo Brasil com a cia. Volksbühne (da
qual se viu "Estação Terminal
América" no ano passado, livríssima adaptação de "Um
Bonde Chamado Desejo", de
Tennessee Williams), Castorf
traz a montagem de "Na Selva
das Cidades" que estreou em
fevereiro na sede do teatro estatal, na antiga Berlim Oriental
-espaço inaugurado em 1914 e
construído por uma associação
de operários. No Brasil, a turnê
passa por seis cidades, começando por São Paulo (há apresentações no Sesc Pinheiros, de
hoje a domingo).
Castorf já disse não, por
exemplo, a um teatro que dirigia e do qual foi demitido no
início dos anos 80, por causa de
um espetáculo politicamente
incorreto. Mais recentemente,
resistiu apenas um
ano como diretor
artístico do Ruhrfestspiel, um festival internacional
do interior alemão,
sob alegação de
"afastar o público".
Deu tempo de levar
o projeto "Os Sertões", do grupo Oficina Uzyna Uzona,
que depois fez temporada no próprio
Volksbühne.
"Teatro é o esporte do pensamento", diz Castorf, 55, que recebe
a Folha no hotel
em que está hospedado.
Saudade da morte
Como Zé Celso, que dirigiu
"Na Selva das Cidades" em
1969, ele destaca a antevisão do
jovem Brecht -é sua terceira
peça- quanto aos regimes de
exceção e à deterioração da vida, em vários aspectos, na cotação do sistema capitalista.
E nem é o Brecht, cujo cinqüentenário de morte é lembrado este ano, do paradigma
da luta de classes, do contorno
épico que vai caracterizar a fase, por assim dizer, mais madura de sua obra. Nos
anos 20, segundo
Castorf, sua dramaturgia soava lírica,
sob influências do
dadaísmo e do jazz,
em meio à lama, à solidão, à selva, ao inferno de Rimbaud.
Anos depois,
Brecht dizia que "Na
Selva..." embutia alguma "saudade da
morte". "Ele assimilou e vomitou tudo
por meio da escrita.
Ao terrorismo político, contestou com o
terrorismo poético, a
independência de
pensador que praticou a vida toda."
No enredo, o bibliotecário
Shlink e o comerciante Garga
entram numa espiral de discussões que passa por valores materiais e imateriais.
Eles até
convivem, conhecem o campo
de um e de outro, há inclusive
uma sugestão homoerótica,
mas o ringue é inevitável.
"O Garga entra com família, o
Shlink com a riqueza. Um sabe
que vai perder a família e o outro sabe que vai perder o dinheiro, num comportamento
de quem é viciado em jogo, um
jogo de forças", diz o diretor.
A turnê, que incorpora técnicos e atores brasileiros, faz parte do programa Copa da Cultura (MinC, Instituto Goethe e
Sesc-SP) e segue para Santos
(Sesc local, 5 e 6/9), Salvador
(Teatro Castro Alves, 9 e 10/9),
Guaramiranga, no CE (Festival
Nordestino de Teatro, 15/9),
Fortaleza (Teatro José de Alencar, 18/09) e Brasília (Cena
Contemporânea - Festival Internacional de Teatro, 21 e 22/
9).
NA SELVA DAS CIDADES
Quando: hoje e amanhã, às 21h; dom.,
às 18h
Onde: Sesc Pinheiros - teatro (r. Paes
Leme, 195, tel. 3095-9400)
Quanto: R$ 20
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