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Veneza recebe Clooney e De Palma
Astro está em "Conduta de Risco", que aborda grandes corporações, enquanto diretor vê a guerra no Iraque em "Redacted"
George Clooney abriu mão de salário em filme que incorpora lições do cinema independente; "Redacted" deixa platéia atônita
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA, EM VENEZA
A presença de George Clooney inaugurou, ontem, o prometido desfile de grandes estrelas no Festival de Veneza
deste ano. Ao lado do diretor e
roteirista Tony Gilroy, Clooney
veio defender "Conduta de Risco" ("Michael Clayton", no original), um projeto de médio
porte, feito à margem dos grandes estúdios, que começa em
Veneza sua luta por visibilidade
na concorrida temporada do
Oscar. No Brasil, tem estréia
prevista para o dia 15/11.
"Conduta de Risco" engrossa, com alguma dignidade, o
"corporate thriller", um novo
gênero que tem seu exemplo
maior em "O Informante", de
Michael Mann, e que de certa
forma veio substituir os suspenses políticos dos anos 70
(como "Missing", de Costa-Gavras, e "Todos os Homens do
Presidente", de Alan J. Pakula).
No lugar das ditaduras militares ou das grandes conspirações políticas estão, agora, as
grandes corporações.
Michael Clayton, o personagem de Clooney, é um advogado em crise moral, que trabalha
para uma grande firma de advocacia. Sua especialidade não
é o palco dos tribunais, mas
ações de bastidores que possam
diminuir o ônus de seus clientes. Depois que um colega de
trabalho começa a ter crises de
paranóia, Clayton descobre
uma trama para impedir a explosiva ação legal contra uma
corporação, que poria em risco
um negócio de bilhões.
Tony Gilroy cita como inspiração o canadense "The Corporation": "É um documentário
fascinante, que analisa as corporações de um ponto de vista
psicanalítico. Concordo até
certo ponto, mas acho algumas
conclusões muito simplistas.
Não gosto de generalizações,
prefiro pensar pequeno para só
depois chegar a conclusões".
Para Gilroy, não há um poder
oculto que tudo manipula: "As
corporações são habitadas por
pessoas, e são pequenas decisões, muitas vezes motivadas
pela inércia ou por um instinto
de auto-proteção, que movem
essa engrenagem". A personagem mais significativa, nesse
sentido, é a advogada interpretada por Tilda Swinton, de certa forma a grande vilã do filme.
Clooney abriu mão do seu salário e ajudou na realização do
filme por meio da produtora
Section 8, que montou com
Steven Soderbergh. "Criamos a
Section 8 para incorporar de
volta ao cinema dos grandes estúdios as lições dos filmes independentes e estrangeiros que
haviam sido esquecidas", disse
o ator, um dos novos símbolos
do liberalismo hollywoodiano.
De Palma no Iraque
Sem qualquer estrela no
elenco, todo rodado em vídeo
de alta-definição, um outro filme americano exibido ontem
conseguiu causar um impacto
bem maior. Ao fim da primeira
projeção para a imprensa de
"Redacted", de Brian De Palma
(também na disputa pelo Leão
de Ouro), a platéia ficou atônita. Não que "Redacted" tenha
sido uma unanimidade, mas foi
o que mais mobilizou discussões. É um violento panfleto
antiguerra e uma investigação
sobre o estatuto da imagem no
mundo contemporâneo.
De Palma retoma, aqui, uma
questão que ensaiou em "Pecados de Guerra" (1989), que falava sobre a brutalidade dos soldados americanos no Vietnã.
Com atores desconhecidos, recria situações que foram descritas pelos soldados no Iraque
usando todo o manancial de
produção de imagem existente
hoje (câmeras de vigilância, câmeras portáteis, blogs, videodiários etc). Apesar da virada
radical em estilo depois do neo-noir "Dália Negra", "Redacted"
resume a grande questão do cinema de De Palma (o poder da
imagem) com força política
brutal. É, desde já, um dos filmes americanos mais importantes dos últimos anos.
O jornalista PEDRO BUTCHER se hospeda a convite do Festival de Veneza
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