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DRAUZIO VARELLA
Dieta e exercícios contra o câncer
É mais fácil convencer a mulher a perder cabelo do que convencê-la a andar meia hora por dia
PREGUIÇA, COMIDA demais e excesso de peso, pecados da vida
urbana, contribuem para aumentar o número de casos de câncer. Esses fatores de risco têm sido
estudados isoladamente para avaliar a importância relativa de cada
um, mas as conclusões ficam comprometidas porque sedentarismo,
obesidade e exageros alimentares
andam de mãos dadas.
Acaba de ser publicado um estudo
importantíssimo no "Journal of
Clinical Oncology", a revista mais lida pelos cancerologistas, sobre o impacto da interação dos fatores citados nos índices de cura de mulheres
operadas de câncer de mama. Vale a
pena descrevê-lo.
As mulheres selecionadas haviam
sido submetidas a cirurgia e demais
tratamentos complementares no
período de 1991 a 2000. Foram
acompanhadas 1.490 mulheres operadas há menos de quatro anos, livres de qualquer evidência de recaída da enfermidade. O período médio
de seguimento foi de 8,7 anos.
No decorrer do estudo, por meio
de consultas médicas e telefonemas
periódicos, os autores quantificaram a presença diária de vegetais e
frutas na dieta de cada participante.
O consumo foi considerado alto
quando acima de cinco porções por
dia. Batatas e sucos de baixo valor
nutritivo não foram incluídos na
contagem.
O nível de atividade física foi classificado em: leve (andar em passo
normal, durante 30 minutos, seis
vezes por semana), moderado (fazê-lo em passo rápido) e extenuante
(correr três vezes por semana).
O cálculo do estado nutricional foi
estimado por meio do índice de
massa corpórea, obtido dividindo-se
o peso pela altura elevada ao quadrado (IMC = peso / altura x altura).
Durante o período de observação,
ocorreram 135 óbitos: 118 por disseminação do câncer de mama, dez
por outros tipos de câncer e sete por
causas diversas.
O IMC influenciou os índices de
mortalidade por causas gerais. As
muito magras, com IMC menor que
20, apresentaram o dobro de mortalidade daquelas com IMC entre 20 e
29,9. Nas obesas (IMC maior que
30), esse aumento foi de 80%.
De acordo com o consumo de vegetais e frutas (V/F) e os níveis de
atividade física (AF), dividiram-se as
participantes em quatro grupos: V/
F baixo e AF baixa, V/F baixo e AF
alta, V/F alto e AF baixa, V/F alto e
AF alta.
Os índices de mortalidade por
câncer de mama nos quatro grupos
foram, respectivamente: 11,5%,
10,4%, 10,7% e 4,8%. As sedentárias
que ingeriram dieta pobre em vegetais apresentaram mais do que o dobro da mortalidade das ativas que fizeram o oposto (11,5% versus 4,8%).
A adoção de apenas uma das medidas benéficas, atividade física ou
consumo adequado de vegetais, teve
impacto bem mais modesto.
Curiosamente, as mulheres classificadas como obesas (IMC maior
que 30), mas que praticaram atividade física e consumiram mais do
que cinco porções diárias de frutas e
vegetais, apresentaram a mesma redução do risco de morte.
Conclusão: a mulher operada de
câncer de mama que decide andar
em passo moderado pelo menos 30
minutos (ou exercício equivalente),
seis vezes por semana, e consumir
diariamente no mínimo cinco porções de frutas e vegetais, reduz pela
metade a possibilidade de complicações fatais. A mesma vantagem é obtida em caso de estar com peso normal, sobrepeso ou obesidade.
Este não é o primeiro estudo a sugerir que a combinação de comportamentos saudáveis reduz a mortalidade por câncer e outras doenças.
O European Healthy Aging Study,
conduzido entre mulheres e homens com mais de 70 e menos de 90
anos, demonstrou que não fumar,
adotar dieta do estilo mediterrâneo,
praticar atividade física e consumir
álcool com moderação reduz a mortalidade por câncer e por outras causas em 60%.
No célebre Nurses'Health Study,
82% dos ataques cardíacos puderam
ser atribuídos à falta de aderência à
combinação dos mesmos fatores.
Se pensarmos que a maioria das
mulheres operadas de câncer de
mama é submetida à radioterapia,
quimioterapia e ao tratamento hormonal, modalidades inevitavelmente associadas a efeitos indesejáveis,
geralmente incapazes de reduzir a
mortalidade em mais do que 35%,
teremos a dimensão da relevância
dos dados apresentados.
Conselho para incluir na dieta cinco porções diárias de frutas e vegetais quase todos aceitam com prazer. Mas por que mistério da biologia humana é mais fácil convencer
uma mulher a receber um tratamento que a fará perder o cabelo,
além de outras inconveniências, do
que conseguir que ela ande 30 minutos em passo moderado, todos os
dias?
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