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TEATRO
Textos do dramaturgo que estão em SP são de sua fase mais prolífica; atividades vão até dezembro
Ciclo exibe tragédias cariocas de Nelson
ROGÉRIO EDUARDO ALVES
da Redação
Foi um fenômeno. A platéia
"explodiu uma vaia jamais concebida. Senhoras grã-finérrimas subiam nas cadeiras e assoviavam
como apaches. Meu texto não tinha um mísero palavrão. Quem
dizia os palavrões era a platéia,
(que) só faltou me enforcar num
galho de árvore".
Ao espetáculo, Nelson Rodrigues (1912-1980) assistia do palco.
Estreava como ator (Tio Raul) em
"Perdoa-me por me Traíres", em
1957, no Teatro Municipal do Rio.
A peça é uma das oito tragédias
cariocas que o dramaturgo escreveu; sete delas ("A Serpente" ficou
de fora) estão na série "Segundas
em Cena Especial Nelson Rodrigues", que começa esta noite no
Sesc Pinheiros, em São Paulo.
A abertura do evento contará
com a participação de Elza Bretanha Rodrigues e Nelson Rodrigues Filho, viúva e filho do escritor, numa conversa sobre sua vida, paixão e obra.
Há atividades programadas para os próximos três meses -sempre às sextas e segundas-feiras.
Todas as sextas, uma personalidade fala sobre temas relacionados à vida e obra de Nelson. Os
encontros são seguidos de uma
exibição de filmes clássicos nacionais baseados em textos do autor.
Às segundas, diferentes grupos
teatrais apresentam leituras dramáticas das sete tragédias (veja
programação abaixo).
A organização pretende, com
isso, dar espaço para que os textos
lidos sejam montados no próximo ano, quando se completam 20
anos da morte do escritor.
Os interessados em aprofundar,
estudar ou pesquisar a obra de
Nelson, particularmente o período da criação das tragédias, podem concorrer a uma das 20 vagas do grupo de estudos que se
reunirá todas as quartas-feiras, às
19h, durante o evento.
Tragédias do subúrbio
Como conta em suas "Memórias", Nelson só encontrava uma
explicação para a reação do público à primeira encenação de "Perdoa-me": "Forçara na platéia um
pavoroso fluxo de consciência".
Uma reação que somente poderia ser explicada pelo retrato fiel,
que o escritor levava à cena, da vida suburbana carioca -numa
peça, dizia ele, inspirada em sua
vizinha de infância.
O gênero tragédia carioca só foi
atribuído a três peças no momento em que foram escritas: "A Falecida" (1953), "Boca de Ouro"
(1959) e "Beijo no Asfalto" (1961).
O problema da classificação das
obras divide os críticos. Sábato
Magaldi conta que o autor abominava o termo "comédia de costumes", que foi como o crítico Pompeu de Sousa primeiro rotulou essas obras que chafurdam no cotidiano suburbano. Para Nelson, o
projeto estético superior estava na
tragédia. E nesse gênero queria
permanecer.
A verdade é que, rigorosamente, os elementos formais dos textos não pertencem nem a uma
nem a outra classificação. Aceita-se, pois, chamar de tragédias a esses textos realistas que marcam
uma nova fase criativa do escritor.
É quando Nelson abandona o
teatro "mítico" para envolver-se
com o cotidiano.
Deixa aquelas obras bastante
simbólicas e quase herméticas como "Anjo Negro" (1946), que não
faziam nem o gosto do público
nem da crítica da época, e passa a
retratar a classe média baixa da
zona norte do Rio de Janeiro.
O dramaturgo ganhava projeção nacional com a coluna no jornal "Última Hora" carioca, "A Vida Como Ela É...". Não por mera
coincidência, as crônicas mostravam o subúrbio e seus personagens.
Para sua dramaturgia, Nelson
carregou não apenas a experiência cotidiana do jornal, mas todo
o "estudo mítico" e psicológico
que desenvolvera em seus textos.
Vista desse ângulo, sua obra pode
ser entendida como uma preparação para o desenho complexo
da realidade cotidiana que realiza
nas tragédias.
A dimensão que o personagem
rodrigueano ganha é a da própria
complexidade do ser humano.
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