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ERIKA PALOMINO
DESFILE DE VERÃO 2005 DA PRADA SIGNIFICA O HOJE
Começa o desfile da Prada,
na tarde ensolarada de anteontem aqui em Milão. Quem vem
lá do fundo da passarela? Uma
modelo loura. Mas quem?
Gemma? Hanna? Não. É Kristen McMenamy, modelo ícone
dos anos 90, desaparecida do
Planeta Fashion.
Na sala ecoa não a suntuosidade do Prokofiev do último
inverno da grife, mas um descolado dub. Isso mesmo, o estilo jamaicano influencia a Prada, enquanto a não-beleza de
Kristen contamina o look do
desfile: cabelo jacu repartido
ao meio, penteado para a frente, chapinha malfeita e grosseira (de propósito, claro, pelo
top Guido). Como Kristen ficou famosa por se apresentar
com a sobrancelha raspada, a
maquiadora Pat McGrath decidiu "apagar" as das tops internacionais de hoje. O resultado:
um certo retorno à estética feia
pregada por Miuccia Prada ao
longo da última década.
Vintage? Só o dela mesma, já
que algumas peças históricas
estão sendo refeitas para as lojas milanesas. Daí a repetição
de elementos como as pedrarias. Mas o que é realmente relevante aqui, na coleção da
marca que de novo deverá ser o
turning point da temporada, é
a coragem de se reinventar
-mais uma vez. Em meio ao
retro ê 50, ao decorativismo e à
latente feminilidade da moda
atual, Miuccia segue agora em
direção à vida real, como declarou à imprensa. "É uma coleção pouco teórica, mais realista, mais simples", confessa a intelectualizada estilista.
Simplicidade franciscana, que nada
A Prada deu, como disse Miuccia, uma guinada em direção à
vida real. Daí, portanto, a sandália oficial do verão da marca
ser um rasteiro modelo franciscano. Que pode vir num (caríssimo) crocodilo, mas simplérrimo na essência. Essencial como
um mocassim, que a marca traz
de volta, dando o OK que faltava para voltarmos a usar o calçado mais confortável depois
dos chinelos. A simplicidade da
Prada é só na vocação. Uma das
características atuais da marca é
justamente o toque dos gênios:
parecer que é fácil fazer tudo
aquilo. Com maestria e coragem, a equipe de Miuccia, liderada pelo jovem diretor de criação Fabio Zambernardi, aciona
o repertório de excentricidades
que colocaram a Prada na história da moda.
Entram em cena uma exuberante saia de penas de pavão, de
corte impecável, plissada atrás;
os chapéus esquisitões enfiados
na cabeça; as exóticas estampas
trompe-l'oeil de penas; a duvidosa aplicação de arara sobre o
vestido sem manga em quatro
cores; o bizarro vestido-cisne
que até parece aquele usado por
Björk, de Marjan Pejovski -de
que na época todo mundo falou
mal. Como se vê, o mundo das
aves inspirou Miuccia Prada,
em sua "beleza, coragem e liberdade", segundo ela, confirmando o atual momentinho
natural/natureza desse verão
2005. Esse despojamento atende a outra das referências da coleção, a Jamaica, que dá o tom
das cores (solares e vibrantes
amarelos, laranjas e roxos), em
muitas listras, completando a
cartela de marrons e esverdeados de que a marca tanto gosta.
Assim, eles respondem a um
dos temas mais fortes de Milão
nesta temporada, o étnico. Enquanto outros olham para a Índia, Marrocos e China, Miuccia
e sua turma seguem relaxados,
se jogando na cultura rastafári.
É o lado divertido e cínico deles.
Que venha o novo
Das toucas dos rastas, eles tiram
uma das melhores idéias, a do
crochê, que vira partes de cima
de vestidos, vestidos inteiros
(como o curtinho usado por
Daria) e barrados de saias. Absurdo. Em termos formais, a
Prada avança também. O grande mérito é se limpar de qualquer ranço visual: sem volume
50, silhueta 40, drapeado 30, estampa 20, proporção 70, cores
80. A coleção significa o hoje. E,
para quem reclama que a moda
nada mais cria, apenas remixa o
passado, eis a resposta.
A silhueta império
As proporções são incríveis,
afiadas e libertadoras. Enquanto marcas globais como Marni e
Marc Jacobs desfilaram sem
correr riscos, sob a cartilha do
que as mulheres querem vestir
agora, a Prada mais uma vez dá
o que não sabíamos que queríamos. As saias são mais curtas (e
olha que a tendência prega o
mais longo ou mesmo o longo),
evitando ainda o famoso pelo-joelho lançado por eles. Mais
até do que as pernas, a cintura é
foco de importância, de novo.
Ela continua marcada, mas em
alguns vestidos, como os plissados do final, segue a silhueta
império, abaixo do busto, que
vem em decote recortado (que
lindo o vestido bege, perfeito
para as celebrities usarem em
prêmios). Outra inovação, que
deverá ser copiada à exaustão, é
o formato um-ombro-só, que
aparece nos vestidos do final.
Inesquecível: McMenamy encerra a revolução com um singelo xale listrado.
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