São Paulo, sexta-feira, 01 de outubro de 2004

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Festival exibe épico revolucionário

LUIZ FERNANDO VIANNA
DA SUCURSAL DO RIO

Saadi Yacef, 76, foi roteirista, produtor e ator de "A Batalha de Argel" (1965) e já assistiu dezenas de vezes ao filme do italiano Gillo Pontecorvo. Ainda assim, ele se emociona ao rever a história da luta contra os franceses pela independência da Argélia, obtida em 1962 após oito anos de guerra.
Na segunda-feira, chorou ao ser aplaudido durante cinco minutos pela platéia do Festival do Rio. "Viva a liberdade!", gritou, revivendo seus tempos de revolucionário. Yacef foi um dos principais líderes da revolta popular contra o colonialismo francês. No filme, interpreta seu próprio papel. Hoje é senador e um dos homens mais poderosos da Argélia.
"Até hoje, quando vejo o filme, eu sorrio e me pergunto: eu fiz mesmo isso? Tenho aquela sensação de quando você olha para trás e se recorda de uma garota bonita: ela fica ainda mais bonita", diz Yacef, que passou quatro dias no Rio com a filha Zaphira, detentora dos direitos da cópia restaurada de "A Batalha de Argel".
A cópia será reexibida hoje, no Festival do Rio. Ainda neste ano, o filme deverá ter relançamento comercial e sair em DVD. "A Batalha de Argel" valeu a Pontecorvo o Leão de Ouro de melhor diretor do Festival de Veneza de 66 e foi indicado a três Oscar.
Pauline Kael (1919-2001), a impiedosa crítica norte-americana, escreveu na época: "É o mais emocionante épico revolucionário desde "Encouraçado Potemkin", de Eisenstein". Além das belezas das imagens em preto-e-branco, o filme impressiona por evitar maniqueísmos e a glorificação de supostos heróis.
"Embora eu tenha comandado a guerra urbana, pedi ao diretor que evitasse o culto à personalidade. Toda a população ganhou a guerra", conta Yacef.
Com exceção de Jean Martin, que interpreta o coronel Philippe Mathieu (misto de vários oficiais franceses), todo o restante do elenco é formado por não-atores. Muitos participaram de fato da luta pela independência.
São especialmente marcantes as cenas em que três mulheres põem bombas em lugares freqüentados por franceses. Antes das explosões, a câmera mostra sem pressa os jovens, as mulheres e crianças que morrerão em minutos.
"Nós tentamos a liberdade por meios pacíficos. Mas os franceses não concordaram. Eles não tiraram lições das outras experiências colonialistas. Para conseguir a independência do país, tivemos que pagar um preço, fazer o sacrifício necessário. Foi uma época de extrema violência", recorda Yacef.
Ele acredita que o relançamento comercial do filme poderá representar uma mensagem contra a violência no mundo. "Ainda há os que querem libertar os países e os que querem continuar oprimindo", diz ele, para quem "todas as mortes são injustas".
Por triste ironia, "A Batalha de Argel" foi visto no Pentágono, antes da invasão do Iraque, por George Bush e oficiais norte-americanos. Eles queriam aprender como lidar com ações terroristas de grupos surgidos dentro de uma população descontente com a ocupação estrangeira.


FESTIVAL DO RIO. "A Batalha de Argel". Onde: Odeon BR. Quando: hoje, às 14h. Quanto: R$ 10.


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