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CINEMA
Entrevistas com pensadores como Isaac Asimov serviram de base para o filme de Kubrick e serão publicadas neste mês
Prólogo inédito de "2001" sai em livro
ANTHONY BARNES
DO "INDEPENDENT"
É a parte que faltava em um clássico do cinema. Quase quatro décadas atrás, Stanley Kubrick reuniu algumas das mais conhecidas
mentes científicas do mundo e
pediu que previssem o futuro. As
idéias dos cientistas formariam a
seqüência de abertura de "2001
-Uma Odisséia no Espaço", épico
sobre uma missão a Júpiter que se
torna uma batalha de vida e morte
entre a tripulação da nave e o
computador de bordo HAL 9000.
Mas as entrevistas jamais foram
exibidas, e os pensamentos reunidos dos 21 eminentes cientistas
pareciam perdidos para sempre.
Agora, as reflexões que eles fizeram a convite do cineasta virão a
público -serão publicadas neste
mês no Reino Unido, provendo
aos entusiastas de Kubrick uma
nova percepção do filme.
Recluso que morreu aos 70
anos, em 1999, pouco depois de
concluir o filme "De Olhos Bem
Fechados", Kubrick sentiu-se fascinado durante toda a vida pela
possibilidade de que existisse vida
extraterrestre inteligente. Ele queria divulgar essa hipótese à audiência como uma premissa para
o filme, permitindo que ouvissem, nas palavras dos cientistas, a
discussão sobre a possibilidade de
existência de culturas extraterrestres benevolentes, a origem da vida e o futuro da humanidade.
As entrevistas, conduzidas em
1966, revelam o pensamento de
muitos dos mais importantes
cientistas de uma era anterior ao
primeiro passeio do homem pela
superfície da Lua. Entre os entrevistados, estão o escritor Isaac
Asimov, a antropóloga Margaret
Mead e os astrônomos Fred
Whipple e Bernard Lovell.
Todos concordaram quanto à
probabilidade de que existisse vida inteligente em outros planetas,
e alguns mencionavam a possibilidade de manipulação genética e
de desenvolvimento de computadores "ultra-inteligentes", dotados de traços de personalidade.
O renomado matemático Jack
Good sugeriu que o próximo estágio da evolução humana poderia
ser a comunicação telepática,
idéia aceita por Kubrick ao final
de "2001", quando o corpo humano se torna redundante.
Outra entrevistada, Constantine
Generales, sugeriu a idéia da internet. O físico Freeman Dyson
propôs que um dia colonizássemos cometas, e Asimov falou de
colônias em Marte ou Júpiter.
Mas, mesmo para Kubrick, diretor que nunca foi conhecido pela brevidade de seus filmes, tornou-se claro que a obra-prima se
tornaria longa demais a menos
que a seqüência com as reflexões
sobre o futuro fosse eliminada. O
diretor nascido nos EUA havia
adquirido reputação invejável
com trabalhos como "Spartacus",
"Lolita" e "Dr. Fantástico", mas
"2001" constituiu um desafio para
muitos espectadores de cinema,
quando lançado, em 1968. Ainda
que fascinados pela visão artística
exposta na tela, que influenciou
numerosos filmes de ficção científica, eles consideravam o filme difícil de interpretar.
Arthur C. Clarke, co-roteirista
de "2001" e autor de "Sentinel", o
conto que inspirou o filme, chegou a admitir que, "se você compreendeu o filme completamente,
quer dizer que nós fracassamos.
Queríamos muito mais suscitar
questões do que respondê-las".
Kubrick, que cuidou da direção,
do roteiro e da produção de quase
todos os seus filmes, se sentia intrigado quanto à possibilidade de
outras formas de vida e estava decepcionado por o mundo do cinema ter até ali tratado a ficção científica sempre na forma de monstros espaciais sanguinários interessados em atacar a Terra.
Tony Frewin, por 25 anos assistente do cineasta, disse que
"quando começou a pré-produção de "2001", em 1965, a posição
da ficção científica no cinema era
em geral a idéia de Flash Gordon,
Buck Rogers, monstros de olhos
esbugalhados e ataques de marcianos. Quando Stanley decidiu
que desejava fazer um filme de
ficção científica futurista sobre vida extraterrestre, se preocupava
com a possibilidade de que vissem o trabalho apenas como mais
um filme de monstros do espaço".
"Assim, o que ele decidiu fazer
foi entrevistar 21 cientistas para
um prólogo que demonstraria
que estudar a possibilidade de vida extraterrestre era uma questão
científica válida. Antes disso, se
você falasse de inteligência extraterrestre, as pessoas pensavam
em discos voadores e bobagens
do tipo. Mas o filme foi se tornando cada vez mais longo, não haveria tempo para o prólogo; o filme
teria de funcionar sem ajuda. A
idéia foi eliminada."
Ainda que tudo isso se tenha
passado há muito tempo, Frewin
queria localizar o prólogo para incluí-lo em uma nova versão em
DVD, lançada em 2001, mas, a
despeito de uma extensa busca,
não encontrou nem traço do material. Ele acredita que seja provável que uma cópia ainda exista,
talvez identificada por rótulo errado e perdida entre rolos e rolos
de filme em um laboratório. "Stanley não descartaria esse material
nem o destruiria. Nunca jogava
coisas fora. Guardava até canhotos de cheques dos anos 40", disse.
No entanto, durante a busca, ele
encontrou transcrições das entrevistas, preparadas por Vicky
Ward, secretária de Kubrick, para
ajudá-lo na edição. Frewin as editou para um livro de entrevistas
que sai em Londres no próximo
dia 8 ("Are We Alone? The Stanley Kubrick Extraterrestrial Intelligence Interviews", editora
Elliott & Thompson). Alguns dos
entrevistados releram seus comentários originais e depuseram
a respeito, passados quase 40
anos. O professor Good confirmou o que havia dito, incluindo
sua sugestão de que os computadores talvez venham a desenvolver traços de personalidade.
"Meu Windows mente e muitas
vezes me força a desligar a máquina contra minha vontade. Comportamento assim seria considerado neurótico em um homem."
Um possível entrevistado que
não participou do projeto foi o astrônomo Carl Sagan, que mais
tarde ganhou fama com o livro
"Cosmos" e uma série de TV derivada. Convidado, ele disse que
queria controlar a edição de sua
entrevista e pediu uma porcentagem nos lucros do filme. Seu pedido foi rejeitado.
Tradução Paulo Migliacci
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