São Paulo, sábado, 1 de novembro de 1997.




Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CLOSE UP Entrevista
A 'noviça rebelde' do pop

PATRICIA DECIA
da Reportagem Local

Quem for à pista de atletismo do Ibirapuera hoje à noite deve presenciar a seguinte cena: vestindo uma camiseta sumária, com o umbigo e a barriga malhada à mostra, muito "pancake", delineador e madeixas oxigenadas, Gwen Stefani, do No Doubt, sobe no palco e grita "fuck you, I'm a girl" (foda-se, sou uma garota).
Mas nem tudo é o que parece. Essa californiana de 28 anos é considerada a "anti-Courtney Love" do mundo pop, no pior sentido do termo. Por trás da frase em princípio desafiadora, está uma garota assumidamente boazinha, que considera a personagem Maria (Julie Andrews), de "A Noviça Rebelde", um modelo de mulher.
Como a da noviça no filme, a fala de Gwen é um retrato de candura, bem próximo à idealização da infância em que a rebeldia consiste de pequenas travessuras bem-intencionadas. E foi puramente por boas intenções que ela incluiu o palavrão no repertório que apresenta no palco.
"Fiquei preocupada que as pessoas pensassem que eu realmente quisesse dizer que sou apenas uma garota, disponível. Durante alguns shows, rapazes não entenderam que se trata de uma canção sarcástica e começaram a falar coisas do tipo 'mostre suas tetas'", afirmou à Folha, em entrevista por telefone, da Califórnia.
Gwen virou estrela nos Estados Unidos cantando "Just a Girl", mas, no resto do mundo, chegou primeiro com a balada "Don't Speak", em que fala das agruras sofridas após sua separação de Tony Kanal, baixista da banda e seu namorado durante anos.
Seu relacionamento amoroso dá o tom à maioria das composições de "Tragic Kingdom", álbum que demorou quase um ano para chegar ao primeiro lugar das paradas norte-americanas.
De namorado novo -o cantor Gavin Rossdale, do Bush-, Gwen conta que já compôs pelos menos sete novas canções, desta vez, falando de experiências sentimentais mais felizes. A seguir, trechos da entrevista.

Folha - Como você define os temas de suas músicas?
Gwen -
As composições de "Tragic Kingdom" foram tiradas da minha vida e o grande tema nelas é o fim do meu relacionamento. Começou a ficar até meio chato, mas era o que estava na minha cabeça e no meu coração.
Folha - Após dois anos, sobre o que você quer escrever?
Gwen -
Agora que viajamos ao redor do mundo e tivemos muito sucesso, minha vida mudou e isso provavelmente vai influenciar bastante o próximo disco. Na verdade, compus sete novas músicas e elas são também, em boa parte, sobre relacionamentos.
Folha - Você já foi chamada de "anti-Courtney Love". Gwen Stefani é uma garota boazinha?
Gwen -
No todo, definitivamente sou uma garota boazinha. Cresci numa família católica e tive uma boa criação, estou satisfeita com ela. Tento ser uma garota boazinha, esse é meu objetivo, não quero ser má.
Folha - Você se sente em oposição à atitude da maioria das novas cantoras dos EUA?
Gwen -
Comecei numa banda aos 17 anos em Orange County, que é fora de Los Angeles. Vi uma grande mudança nesse tempo, mesmo nos últimos quatro anos, com as mulheres tomando a frente e sendo levadas mais a sério. Tocávamos em festivais com bandas punk, só de homens, e era difícil competir. Mas descobri há muito tempo que deveria ser eu mesma e não me preocupar em ser a "mina durona". Sou durona em alguns aspectos, mas sou também uma garota, cresci brincando com Barbies e gosto de batom e maquiagem. Tenho um lado feminino e não tenho vergonha disso.
Para mim, o feminismo nos anos 90 não é estar contra os homens. É ser levada a sério, como igual, e não apenas um tipo de brinquedo sexual ou uma boneca para admirar. Acho que queremos tudo, e não há nada de errado com isso.
Folha - Você considera ter duas personas, uma no palco, que diz palavrões, e outra fora dele?
Gwen -
As pessoas dizem que há dois lados de mim. Não acho. "Just a Girl" foi escrita como um reflexo de algumas experiências. Quando eu queria ir ao banheiro, sentia como se precisasse de alguém para me acompanhar, porque poderia haver algum perigo. Há coisas que só garotas têm de se preocupar, isso inspirou a música. O palavrão apareceu porque fiquei preocupada que as pessoas pensassem que eu realmente quisesse dizer que sou apenas uma garota, disponível. Durante alguns shows, rapazes não entenderam que se trata de uma canção sarcástica e começaram a falar coisas do tipo "mostre suas tetas".
Folha - Isso aconteceu muito?
Gwen -
Por um tempo, principalmente nos festivais. Tocando ao vivo, você descobre algumas coisas que funcionam. E incluir a frase foi uma maneira de resolver. Não é algo para ter vergonha.
Folha - Você mora com seus pais?
Gwen -
Na verdade, eles acabaram de me despejar (risos). Quando cheguei, todas as minhas coisas estavam na garagem, prontas para a mudança. Estou procurando uma casa para mim.
Folha - Quem é a mulher pública que você mais admira?
Gwen -
Uma das minhas maiores influências é Julie Andrews em "A Noviça Rebelde". Ela é linda, tem uma voz maravilhosa. Assisti ao filme quando criança e isso me influenciou. Quero conhecê-la, ela é, definitivamente, minha heroína.
Folha - Ela tem essa aura de...
Gwen -
Bondade? Sim! Ela é tão pura, esse é o papel que ela sempre interpreta.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.