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Núcleos de produção sem hierarquia fundem ativismo e diversão mudando a forma de fazer e consumir cultura
Interferência coletiva
ALEXANDRE MATIAS
FREE-LANCE PARA A FOLHA
"Talvez por representar uma alternativa dentro do modelo atual
da industria do entretenimento?",
responde perguntando H.D. Mabuse, fundador do grupo
Re:Combo, sobre o motivo de o
formato coletivo estar cada vez
mais difundido. Sejam grupos de
DJs, artistas plásticos ou guerrilheiros de mídia, os coletivos se
espalham por diferentes áreas da
cultura brasileira, mudando a forma de fazer e consumir arte, política e diversão.
O rótulo "coletivo" não tem definição mais específica do que um
grupo de colaboradores que se
unem para realizar algo em conjunto. E é justamente essa dificuldade de classificá-los que os torna
uma opção tão viável para quem
quiser se expressar artisticamente: junte os amigos e descubra algo que todos estejam a fim de fazer. Se der certo, dá até mesmo
para pagar as contas com um coletivo -o que, quando acontece,
é uma consequência, e não uma
motivação.
"O principal é o fato de você estar trabalhando com mais pessoas", conta Rica Amabis, do coletivo Instituto, que reúne diferentes pontas da nova safra da
música brasileira graças à flexibilidade do formato.
"A estrutura enxuta e o investimento coletivo potencializam recursos e idéias", continua Giuliano Scandiuzzi, do coletivo de vídeo Bijari. "As pessoas estão de
saco cheio do formato corporativo e começaram a perceber que
arte não é um negócio como outro qualquer", completa Daniel
Poeira, do grupo mineiro de animação Poeira Filmes.
"Ganha-se velocidade na produção e desenvolve-se a especialidade de cada um", complementa
Érico Assis, do Projeto Casulo, de
Pelotas (RS).
"É a arte como pretexto para encontrar pessoas", sintetiza o paulistano Fábio Tremonte, mediador, catalisador e o único a conhecer todos os integrantes do grupo
Los Valderramas.
Indagada sobre a principal influência para trabalhar em coletivos, a artista plástica e agitadora
cultural Graziela Kunsch, idealizadora do "coletivo de coletivos"
Rejeitados é direta: "Os individualistas". Ricardo Rosas, do grupo paulista Rizoma, concorda: "O
individualismo saturou. Há uma
necessidade básica de se agrupar,
que os meios eletrônicos tendem
a facilitar. Sai a rubrica egocêntrica do "gênio criador" e entra a voz
coletiva do anonimato criativo e
compartilhado".
Sem líderes e de hierarquia horizontal, coletivos não são, nem
de longe, uma novidade. "O coletivo sempre esteve em voga", continua Daniel Seda, do grupo de vídeo e cinema Neo Tao, "a diferença hoje é que os artistas estão pondo mais ênfase na ação e na colaboração criativa do que no ego".
"É uma tradição na história da
contracultura e arte alternativa",
lembra Daniel Gonzalez, da
T.E.M.P.. Na genealogia estão escolas modernistas, ativistas dos
anos 60, "artivistas" dos 80 e a cultura eletrônica. A nova safra de
coletivos nasce justamente sob o
signo da internet: "O nosso coletivo é baseado na premissa do fim
da geografia trazida pela rede",
explica Mabuse.
"A mudança de cima para baixo, do centro para a periferia, já
não é mais possível, como alertavam os anarquistas clássicos no
século 19", explicam os integrantes da Universidade Invisível. "A
idéia de coletivo surge de uma
questão de sobrevivência", responde o grupo A Revolução Não
Será Televisionada. "Há uma sensação de que algo precisa ser feito", sintetiza Seda.
E o que está sendo feito? De festas instantâneas a intervenções
urbanas, os grupos buscam novas
formas de expressão, invertendo
também a lógica do público, que
aos poucos deixa o papel de mero
espectador. Discos, revistas, sites
e livros são produzidos, mas a
própria noção de registro do
acontecimento vem sendo deixada de lado em prol da experiência.
Diferentes ângulos de uma mesma transformação: para o grupo
Formigueiro, "o coletivo é parte
da sociedade da informação, em
que todos se comunicam o tempo
todo"; enquanto o coletivo de e-music Soononmoon, de Salvador,
fala da presença "de um sentimento chamado de "pronóia", que
é quando as coisas tendem a dar
certo"; e o Expressão Sarcástica
sintetiza tudo ao dizer que "o coletivo tem uma dinâmica muito
maior que o indivíduo".
Veja lista de coletivos na Folha Online
(www.folha.com.br/ilustrada)
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