São Paulo, domingo, 02 de janeiro de 2005

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ARTES GRÁFICAS

Campeões de festivais de humor nem sempre encontram espaço para publicar

Viver ou sobreviver de salão?

DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL

Ao mesmo tempo em que rareia o espaço para cartunistas, quadrinistas e ilustradores na imprensa de todo o país, um número crescente de salões e festivais vêm cumprindo a missão de divulgar os trabalhos desses profissionais do traço, acenando com premiações cada vez mais convidativas. Fenômeno ou anomalia?
"Existem dois pontos de vista. Mas acho que o lado positivo é mais interessante. Os salões têm contribuído para a sobrevivência do ofício do chargista. Como dar maior ênfase a eles dentro da imprensa brasileira são outros 500." Quem afirma é Zélio Alves Pinto, que pode ser considerado o pai dos salões no Brasil.
Envolvido na organização dos seminais Salão de Humor do Mackenzie, em 1972, e Salão Internacional de Humor de Piracicaba, em 1974, Pinto milita até hoje na área e, além do Salão de Humor de Caratinga, que ajudou a estabelecer em sua cidade natal, participou da criação de mais um importante evento nacional: o Salão Internacional de Humor Gráfico das Cataratas do Iguaçu, que teve sua segunda edição realizada em novembro passado.
Apesar do pouco tempo de vida, o salão de Foz já ensaia passos na direção de se tornar "um centro nacional e internacional de humor", nas palavras de Pinto, que compreenderá não só exposição de cartuns mas mostras de teatro e de cinema de humor.
Se, por um lado, há um claro interesse econômico da estância paranaense em explorar sua vocação turística por meio desses eventos, por outro, há a fome dos desenhistas nacionais e estrangeiros pelos prêmios oferecidos -US$ 10 mil para o primeiro colocado, US$ 5.000 para o segundo, e mais US$ 5.000 para terceiro, quarto e quinto lugar.
"Hoje, o maior salão do país é o das Cataratas. Tanto para o ego, quanto para o bolso. Vencer em Foz é como ganhar na loteria", afirma o piauiense José Antonio Costa, o Jota A., 36.
Presente nos principais salões do país desde 94, quando venceu em casa o Festival de Humor do Piauí, Jota A. conquistou, só neste ano, dois primeiros lugares (Piauí e Ribeirão Preto), dois segundos lugares (Piracicaba e Presidente Prudente), além de duas menções honrosas (Pernambuco e Volta Redonda). "Para a gente, que é do Nordeste, o salão é uma vitrine. Uma coisa é dizer que sou o cartunista do jornal de Teresina. Outra é dizer que sou o cartunista que venceu o salão de Piracicaba."
Também em busca de maior visibilidade nacional, o artista pernambucano Luciano Félix, 29, foi um dos grandes papa-salões deste 2004: arrematou os primeiros lugares na categoria HQ em Piracicaba, Piauí e Volta Redonda.
"Tudo tem acontecido muito rápido. Desde o início do ano já foram cinco prêmios", diz o quadrinista, que pegou ainda um quinto lugar em Foz do Iguaçu e teve um de seus trabalhos selecionados no Festival Internacional de Humor DST & Aids, promovido pelo Ministério da Saúde.
A maior bolada do ano, no entanto, ficou com Dálcio Machado, 32. Chargista do "Diário Popular", de Campinas, Dálcio embolsou sozinho um cheque de 10 mil como o vencedor da Bienal Internacional de Caricatura e Desenho Humorístico de Santa Cruz de Tenerife, na Espanha.
"Apesar de ter ganhado um dinheiro legal com meus prêmios, nunca vivi exclusivamente deles", afirma o cartunista, que participa de salões desde os 13 anos e traz no currículo 68 prêmios, incluídos aí os principais salões do Brasil, além de Coréia do Sul, Irã e Japão, hoje o prêmio mais alto do mundo (cerca de US$ 20 mil). "Alguns móveis da minha casa têm o nome do salão de onde veio a grana para comprá-los. O sofá se chama Líbero Badaró, o guarda-corpo da escada é Unacon. Provavelmente, Tenerife vai ser o nome de um carro e de algumas contas."
Ainda em 2004, outros brasileiros venceram prêmios no exterior, como é o caso de Cau Gomez, primeiro colocado do Prêmio de Humor Gráfico Curuxa 2004, realizado em La Coruña, na Espanha; Bira Dantas, que venceu na Turquia; Airon e Orlandeli, ambos terceiros colocados no 4º Concurso Internacional de Humor Gráfico sobre Novas Tecnologias da cidade basca de Barakaldo, na Espanha; e Rico, no 12º Concurso de Banda Desenhada e Cartoon de Moura, em Portugal.
Opa, já dá para fazer um pé de meia? "A verdadeira vocação dos desenhistas é publicar. Os salões são uma alternativa em países que não têm um mercado editorial forte. Quando você examina os catálogos, nota que os trabalhos vêm do Leste Europeu, da Ásia e da América Latina. Os ingleses e americanos pouco participam. Nem mesmo os desenhistas dos Estados centrais do Brasil, como os Caruso, o Laerte e o Angeli. Eles já têm espaço para publicar", disserta o veterano Santiago, 54, que já levantou a taça dos principais salões do Brasil e do mundo, mas que deve também aos japoneses pelo menos alguns tijolinhos da residência em que vive hoje em Porto Alegre.


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