|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ANÁLISE
Autor tratava história como elemento vivo
SYLVIA COLOMBO
EDITORA DA ILUSTRADA
As vozes antiditadura mais
significativas da Argentina vão
silenciando-se uma a uma. Em
outubro, morreu a cantora
Mercedes Sosa. Agora, vai-se o
escritor Tomás Eloy Martínez.
O argentino trabalhou em vários suportes: ensaios, reportagens, artigos para jornais de vários países e romances.
A característica mais comum
de seus textos era a tentativa de
expor a história do país como
algo vivo e essencial para a reflexão seja sobre a ficção, seja
sobre a realidade.
Apesar da posição combativa
contra o regime militar argentino (1976-1983), Martínez não
viveu nenhum dia de chumbo
em seu país. Exilou-se muito
cedo, em 1975, primeiro na Venezuela, depois nos EUA, de
onde só voltou em 1984.
Pouco antes, teve seu relato
"A Paixão Segundo Trelew"
(1974), sobre o massacre de
presos políticos num presídio
na Patagônia, queimado pelas
autoridades em praça pública.
O período histórico que mais
o fascinava era o do peronismo.
No final dos anos 60, conheceu
o próprio Juan Domingo Perón
e gravou com ele várias horas
de entrevistas. Foram o ingrediente principal para que escrevesse os romances políticos
"Santa Evita" (1995) e "Romance de Perón" (1985).
Ambos compõem o principal
de sua obra. São uma mistura
de história e ficção, costurada
por uma narrativa envolvente,
em que Martínez trata o período sem maniqueísmos e ressaltando a importância das características psicológicas dos personagens nos acontecimentos.
Ainda, joga luz às reações e ao
comportamento da sociedade,
relativizando o peso de personagens históricos isolados.
O mundo do jornalismo, ofício de que tanto gostava, aparece em "O Voo da Rainha"
(2002), inspirado no caso brasileiro Pimenta Neves. "O Cantor de Tango" (2004), por sua
vez, é uma viagem nostálgica
pela Buenos Aires tangueira,
uma trama de mistério em que
um cantor imaginário aparece
de surpresa para cantar em
pontos inusitados do mapa da
cidade. Na obra mais recente,
"Purgatório" (2008), com um
toque ficção científica, Martínez dá vida ao fantasma de um
desaparecido da ditadura.
Assim como alguns colegas
de geração, como o mexicano
Carlos Fuentes e o peruano
Mario Vargas Llosa, Martínez
estava sempre opinando sobre
política e temas do noticiário.
Mesmo vivendo nos EUA,
acompanhou revoltado o "estallido" [crise política argentina
de 2001] e, recentemente, comemorou a vitória de Obama.
Apesar de realista, defendia
que a América Latina devia lutar por um posto de protagonista na geopolítica mundial.
Em entrevista à Folha em
2004, ainda durante os anos
Bush, disse: "Não acho positivo
que sejamos países pouco importantes. Os EUA são uma potência hegemônica e sua voz se
irradia. Se somos desimportantes para eles, deixamos de sê-lo
também para a União Europeia
e para o Oriente."
Texto Anterior: Escritor argentino Eloy Martínez morre aos 75 Próximo Texto: Beyoncé é campeã do Grammy 2010 Índice
|