São Paulo, sábado, 02 de abril de 2011

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Não ousar é ser infiel ao livro, diz Galindo

Já Rubens Figueiredo, que prepara versão de "Guerra e Paz", critica tentativa de reduzir impacto de Tolstói

Tradução do romance russo, que sai pela Cosac Naify no segundo semestre, levou três anos para ser concluída

Theo Marques/Folhapress
Caetano Galindo em sua biblioteca,em Curitiba (Paraná)

DE SÃO PAULO

Das inúmeras armadilhas que "Ulysses" impõe a qualquer tradutor, Caetano Galindo avalia que a maior delas está no episódio "Gado de Sol". Joyce criou ali uma sucessão de pastiches da língua inglesa de várias épocas, do final do primeiro milênio ao século 19.
Para recriar o estilo, Galindo inspirou-se no cancioneiro medieval português.
Em outros episódios também tomou certas liberdades, como incluir alusões à literatura brasileira (Tomás Antônio Gonzaga, Augusto dos Anjos").
"A maior fidelidade que eu posso esperar alcançar em relação ao "Ulysses" é que o meu livro sirva para fazer as mesmas coisas que o original fazia. Não tomar liberdades seria o caminho mais curto para não ser fiel ao livro."
Sobretudo, empenhou-se em manter, mesmo que por meios diferentes dos de Joyce, o brilho estético e, por que não, o humor da obra. "É provavelmente o livro mais prazeroso que eu conheço."

PAINEL RUSSO
Não foram menores as dificuldades do romancista e tradutor Rubens Figueiredo, 55, quando decidiu debruçar-se sobre "Guerra e Paz".
Figueiredo não é estreante em Tolstói (também para a Cosac Naify já havia traduzido outros títulos do autor, como "Anna Kariênina" e "Ressurreição"), mas a empreitada impunha outros desafios.
Além do tamanho descomunal, o romance enfoca um período de grande turbulência na Rússia e tem centenas personagens, fictícios e reais.
O maior perigo, contudo, é mais bem sutil, explica ele. Trata-se de que chama de "tradução colonizadora", que busca enquadrar Tolstói na condição de "clássico" e apaziguar o efeito do livro.
"O grande perigo consiste em reduzirmos os livros à perspectiva que adotamos hoje. Esse tratamento denota antes de tudo -e de modo flagrante no caso de Tolstói- uma tentativa de reduzir o alcance crítico e questionador dos escritos", afirma.
Fora isso, há as dificuldades da língua russa (e do estilo de Tolstói) que o tradutor conhece bem, como as inversões sintáticas e a longa extensão dos períodos.
Figueiredo também é autor de contos e romances (já ganhou dois Jabutis). Por estar dos dois lados do campo de batalha literário, sabe bem que, em certo grau, sempre se perde algo na tradução, mesmo nas melhores.
"Por outro lado", completa ele, "se ganha algo muito mais importante: a atualização de uma voz e de um ângulo de visão que não poderiam chegar a nós de nenhuma fonte contemporânea".
Entre perdas e ganhos, foram três anos de trabalho dedicados à "Guerra e Paz". "É engraçado", conta, "mas no fim, uma das coisas que senti foi que gostaria de começar de novo no dia seguinte".
(MARCO RODRIGO ALMEIDA)


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