São Paulo, sábado, 02 de maio de 2009

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Crítica / "A Formação da Culinária Brasileira"

Sociólogo levanta temas importantes e sugere reclassificar culinária do país

JOSIMAR MELO
CRÍTICO DA FOLHA

Poderia ser a coisa mais banal do mundo, mas a culinária brasileira -a própria noção de uma culinária brasileira, num país com tantas diferenças e história bem recente- é um assunto que, olhado de perto e tomado a sério, pode e deve dar muito pano para manga.
Um dos pensadores -sociólogo, escritor, estudioso do assunto- que mais se tem dedicado a isso é Carlos Alberto Dória, que lança agora "A Formação da Culinária Brasileira" (entre seus livros recentes, estão "A Culinária Materialista" e, junto com Alex Atala, "Com Unhas, Dentes & Cuca".) O novo livro não é uma obra extensiva nem com o fôlego que o título poderia induzir a pensar. Não chega a 90 páginas, mas permeia muitos dos assuntos que cada vez mais requerem a atenção de quem estuda ou trabalha com gastronomia -e indiretamente, todo o público que a usufrui.
Dória mostra que o Brasil é terra de tesouros culinários, mas que, em suas vicissitudes históricas (como o rumo de sua colonização, por exemplo), não chegou a formar uma sólida identidade culinária nacional.
E, por meio de mimetismos aqui e falsos mitos ali, ainda por cima deixou de explorar muito de seus potenciais.
Retomando temas já abordados em outros escritos, o autor relembra que a originalidade do gosto brasileiro pode estar muito mais pelo caráter miscigenado do seu povo (e de sua produção cultural) do que pela identificação e superposição estanque de seus elementos constitutivos (índios, portugueses, africanos).
Ou que a tipicidade de nossas diferentes cozinhas pode estar totalmente fora da divisão regional do Brasil instituída pelas autoridades, com um sentido mais administrativo do que de afirmação e consolidação de realidades homogêneas.

Tipicidades locais
A esse propósito, aliás, "A Formação da Culinária Brasileira" chega a alinhavar uma sugestão de classificação das cozinhas com base na tipicidade dos produtos locais (e, por isso, não necessariamente em regiões geograficamente contínuas). Por exemplo: no lugar da culinária do Norte, a culinária amazônica (caracterizada pelo uso da mandioca e produtos da floresta, como peixes e frutas); no lugar de cozinha do Nordeste, a culinária da costa (do Ceará ao Espírito Santo, com uso de peixes, frutos do mar e leite de coco); em vez de cozinha mineira, a culinária caipira (abarcando São Paulo, Minas Gerais e franjas do Centro-Oeste, calcada em milho, porco, frango e técnicas portuguesas), e assim por diante.
Para completar, Dória sugere que doravante haja uma especial atenção em se debruçar sobre os ingredientes brasileiros, mais do que nas receitas históricas ou nos contornos étnicos de suas origens. Uma forma interessante, mesmo que não excludente, de recuperar tradições (há produtos caindo em desuso, esquecidos) e ao mesmo tempo de usar um belo arsenal para a criação de novos pratos com uma originalidade intrinsecamente brasileira.


A FORMAÇÃO DA CULINÁRIA BRASILEIRA

Autor: Carlos Alberto Dória
Editora: Publifolha
Quanto: R$ 12,90 (88 págs.)
Avaliação: bom




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