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LIVRO/LANÇAMENTO
Em "Uma Nova Geração Define o Limite", autor analisa contradições do discurso intervencionista
Chomsky pega seus inimigos pela língua
DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL
O pensador e linguista norte-americano Noam Chomsky, 75,
resolveu montar engenhosa armadilha para desafiar o governo
de seu país: em "Uma Nova Geração Define o Limite" (2000), lançado agora pela editora Record, o
professor do Massachusetts Institute of Technology (MIT) pega
seus inimigos pela língua.
Tecida a partir de ensaios para
publicações como o "Le Monde
Diplomatique", a obra expõe o
ponto de vista do autor de "Manufacturing Consent" sobre declarações dos governos Clinton e
Blair na virada do século e as atuações de seus países nas guerras de
Kosovo e no Timor Leste.
"Há momentos em que simplesmente não é possível olhar
para o outro lado como se não estivéssemos vendo", transcreve declaração do então presidente Bill
Clinton, em 1999, véspera dos
bombardeios da Otan contra o
governo sérvio. Na contramão, cita a Colômbia, com "o pior histórico de violação dos direitos humanos do hemisfério Ocidental
ao longo da década de 1990" e
"principal beneficiário da ajuda e
do treinamento militar dos EUA".
O premiê britânico e tradicional
aliado dos americanos, Tony
Blair, empresta não só o título do
livro -"A New Generation
Draws the Line", tirado de uma
reportagem que concedeu à revista "Newsweek" em abril de 99-,
mas também o aval para uma das
três premissas básicas apontadas
por Chomsky para o novo manual de intervencionismo das potências ocidentais para o século
21: a credibilidade da Otan.
"O essencial é que não poderíamos perder. Se perdêssemos, não
teríamos apenas fracassado em
nosso objetivo estratégico; derrotados em nosso propósito moral,
teríamos desferido um golpe arrasador na credibilidade da Otan",
cola à argumentação declaração
de Blair à BBC, em 2000.
Um amontoado de aspas -e de
valiosas notas bibliográficas-
poderia ser, para dizer o mínimo,
a comprovação do batido ditado
de que todo peixe morre pela boca. Só que Chomsky está longe de
comemorar o ensopado: "A
maioria da população dos EUA
continua sem saber nada do que
se passou no Timor Leste. E o
pouquinho que sabia do que
aconteceu em Kosovo provavelmente já esqueceu", afirma o intelectual, por telefone, à Folha.
Apesar do sucesso recente de livros seus como "11 de Setembro",
lançado logo após os atentados de
2001 e responsável por vendas de
mais de 200 mil exemplares nos
EUA, Chomsky lembra que seu
"Uma Nova Geração Define o Limite" não encontrou o mesmo
eco na mídia americana.
"[Os grandes jornais] Não podem aceitar uma análise crítica
como essa. O livro não podia ser
mencionado na imprensa, sob o
risco de haver uma grande histeria", diz. "Sobre o Timor Leste,
por 25 anos não havia cobertura
na imprensa de que os EUA forneciam à Indonésia apoio diplomático e militar para conquistar e
virtualmente destruir um país."
Entre outros argumentos questionados por Chomsky no livro
está o de que os ataques nos Bálcãs teriam sido movidos pela
preocupação de "evitar uma limpeza étnica" comandada pelos
homens de Slobodan Milosevic.
"Hoje sabemos que aquelas atrocidades foram uma consequência
da guerra, não a sua causa", cita,
reimprimindo as aspas do general
Wesley Clark, então comandante
americano da Otan, de que, diante dos bombardeios, a intensificação do terror sérvio seria "inteiramente previsível".
Com George W. Bush no poder
e pelo menos mais meia dúzia de
livros sobre as relações da mídia e
o poder americano nas estantes,
Chomsky tem muito que trabalhar. "Estamos diante de um grupo bastante extremista com uma
meta internacional bem clara: a
dominação do mundo pela força." Nada de novo no front?
UMA NOVA GERAÇÃO DEFINE O LIMITE. Autor: Noam Chomsky. Lançamento: Record. Quanto: R$ 22.
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