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TEATRO
Pesquisadora austríaca radicada no Brasil capitaneia montagem da tragédia grega, que estréia sexta em Porto Alegre
Rosenfield propõe "novo olhar" sobre "Antígona"
VALMIR SANTOS
ENVIADO ESPECIAL EM PORTO ALEGRE
No futuro, um historiador do
teatro brasileiro que olhar para
estes meados de década vai encontrar uma convergência de
montagens de "Antígona".
Em 2003, o grupo Os Satyros
mostrou em SP um libelo anti-Bush centrado em Creonte, dirigido por Rodolfo García Vázquez.
Na mesma temporada, o Pia
Fraus lançou "Olhos Vermelhos
-Tributo a Antígona", em que a
encenadora convidada, Ione Medeiros, sublimou o caráter heróico da mulher que reivindica, sem
violência, o direito de sepultamento do irmão, contrariando o
rei de Tebas, Creonte.
Até o final deste ano, o encenador Antunes Filho deve estrear a
sua versão da tragédia grega de
Sófocles (século 5 a.C.). E na próxima sexta-feira Porto Alegre
pontua outra leitura.
A "Antígona" que estréia no
teatro São Pedro, na capital gaúcha, com direção de Luciano Alabarse, busca traduzir em cena as
perspectivas teóricas da pesquisadora Kathrin Rosenfield, uma devota da obra. (Em tempo: em
1990, a cidade viu uma premiada
montagem do grupo Ói Nóis
Aqui Traveiz, "Antígona, Ritos de
Paixão e Morte").
Autora de três livros e dezenas
de artigos sobre "Antígona", a
austríaca Rosenfield, radicada no
Brasil desde 1984, propõe um
"novo olhar" sobre a história da
filha nascida da união incestuosa
de Édipo e Jocasta.
"Um belo dia, pensei que era
hora de admitir este fato: todas as
encenações e traduções da "Antígona", no fundo, me repugnavam
e as "chaves" interpretativas que
opõem a bela Antígona ao Creonte hediondo pareciam mais trancar do que abrir perspectivas vivas", diz Rosenfield, 50.
Ela aponta algumas recorrências: a oposição da nobre mártir
contra o tirano abjeto (em Goethe), a família contra o Estado
(Hegel), a juventude contra a velhice (Brecht) e a transcendência
divina contra a imanência humana (Reinhardt). Todas, segundo a
pesquisadora, assentadas no maniqueísmo do bem versus o mal.
"Onde está o "trágico" de verdade, um erro humano sem vício,
uma impossibilidade, um limite
que expõe a ferida sem remédio
da condição humana?", se perguntava, colocando de lado o que
considera um viés cristão, de culpa, vergonha, em favor de essência trágica mais complexa.
Rosenfield quer valorizar a dupla tragédia, na qual os personagens principais perseguem com
sinceridade um alvo razoável. Antígona (papel de Evelyn Ligocky)
quer enterrar o irmão, condição
mínima para salvar a honra da estirpe. Creonte (José Baldiserra)
procura pacificar a cidade com
um rito purificador que faz do cadáver de Polinice o bode expiatório dos males de Tebas, enquanto
recupera Etéocle como amigo
exemplar (este, morto no mesmo
embate com o irmão Polinice, a
quem também mata). O rei, em
suma, quer substituir a linhagem
"poluída" de Édipo pela sua própria.
Alabarse acolhe essas "camadas
de significados" apoiando-se
também no coro (ao todo, são 31
atores ou bailarinos no palco). A
equipe de criação soma ainda Artur de Farias (compositor), Marcelo Delacroix (direção musical),
Carlota Albuquerque (coreografia), Davi Ribeiro (cenografia),
Malu Rocha (figurinos) e Cláudia
de Bem (iluminação).
ANTÍGONA. De: Sófocles. Tradução:
Lawrence F. Pereira. Com: Luciano Éboli,
Mauro Soares, Alexandre Silva e outros.
Onde: teatro São Pedro (pça.Marechal
Deodoro, s/nš, Porto Alegre, tel. 0/xx/
51/3226-7595). Quando: estréia dia 6/8;
qua. a sex., às 21h; dom., às 18h. Quanto:
R$ 20. Até 15/8.
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