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LITERATURA
"Spider", do autor inglês, ganhou versão cinematográfica que será exibida no Festival do Rio e na Mostra de SP
McGrath descortina universo manicomial
GUILHERME AQUINO
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM MILÃO
O escritor Patrick McGrath disse uma vez a jornalistas que não
ouvia música, não bebia e não fumava... Recentemente, ele explicou que isso só valia para quando
estivesse escrevendo um livro.
A história é bem diferente depois do ponto final, contou o inglês radicado em Nova York. Filho de um psiquiatra, durante sua
infância e adolescência McGrath
teve como amigos e companheiros de partidas de xadrez os hóspedes do manicômio Boonmary,
nos arredores de Londres.
A espinha dorsal de seus livros
são os personagens sempre perturbados, descompensados, sem
futuro, mas transitando entre o
presente e o passado, a razão e a
loucura, as perdas e os danos.
O escritor abre as portas dos
manicômios para o grande público leitor em tramas onde a percepção do tempo e do espaço, da
realidade e da imaginação se confundem. E é quase impossível
passar impune pelas viagens que
o autor propõe aos labirintos da
mente.
Seus livros descortinam o véu
que encobre relações perigosas
que qualquer um de nós está sujeito a viver ou a sobreviver.
McGrath brinca de ilusionismo
com a mente do leitor, hipnotizando-o com teias de histórias
bem tecidas e amarradas.
O romance "Spider" (1990) ganhou recentemente uma versão
para o cinema pelas mãos do canadense David Cronenberg e do
próprio McGrath, que assinou o
roteiro. A produção traz Ralph
Fiennes no papel de um esquizofrênico que depois de 20 anos internado num manicômio volta a
morar no mesmo local onde passou a infância.
O filme será exibido no Festival
do Rio BR 2002 e na Mostra Internacional
de Cinema de São Paulo, que começa no próximo dia 18.
Leia a seguir a entrevista que
McGrath concedeu à Folha, em
Milão.
Folha - Qual foi o ponto inicial para escrever "Spider"?
Patrick McGrath - Eu parti de
uma trama na qual um homem
mata a própria mulher e coloca
em seu lugar a amante. Nesta história, eu decidi inserir o filho deste homem, que assume o papel de
narrador. Spider é o apelido deste
pré-adolescente que tenta colocar
ordem no caos de recordações.
Recordo a história de Spider e ele
recorda sua história e suas lembranças desses eventos, que se
apresentam falsos e verdadeiros.
Folha - O que há de semelhante
no relacionamento entre o psiquiatra e seus clientes e o autor e seus
personagens?
McGrath - Acho que existe essa
necessidade de uma compreensão profunda da experiência dos
outros. O psiquiatra utilizará esta
compreensão para cuidar do seu
cliente; por outro lado o escritor a
utiliza para contar uma história.
Folha - Que surpresa ou descoberta o senhor fez ou vivenciou ao
longo das pesquisas para dar vida a
seus personagens?
McGrath - O melhor que eu descobri foi na frase de um livro de
Artur Lang, psiquiatra e escritor
escocês, que diz: "Um esquizofrênico é um homem que morre de
sede num mundo cheio de água".
E esta é a chave para entender
meu personagem. Meu personagem é um tipo especial de esquizofrênico, que faz uma procura
desesperada pelo calor humano,
pelo contato humano, mas é incapaz de agarrar o que lhe é oferecido. Enfim, um personagem que
morre porque não consegue estabelecer contato.
Folha - Alguns manicômios na Inglaterra foram fechados durante a
década de 80. O que estava por trás
desta medida do governo?
McGrath - A principal razão é
econômica, mas isso não diminui
o valor social agregado a essa iniciativa. É uma ótima oportunidade de aproximar mais a sociedade
dos deficientes mentais, daqueles
que são deixados à margem de tudo, sem escolha, numa condenação. E acho que o voluntariado é
uma arma importante contra o
tratamento dado aos deficientes.
Folha - Vistos de longe todos são
normais... E de perto?
McGrath - (risos) Esta é uma frase
muito interessante, tem muita sabedoria... Não, ninguém é normal
se visto muito de perto.
SPIDER. Autor: Patrick McGrath.
Lançamento: Companhia das Letras.
Preço: R$ 31 (248 págs.).
SPIDER. Direção: David Cronenberg.
Com: Ralph Fiennes. Onde: Festival do
Rio BR.
Veja a programação completa em www.uol.com.br/folha/especial/2002/festivaldoriobr/
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