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"24 CONTOS DE F. SCOTT FITZGERALD"
Traduzido por Ruy Castro, compilação traz histórias que espelham a América
Em breves sonhos, autor faz crônicas da perda
CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
ESPECIAL PARA A FOLHA
Quando o dono de um dos
melhores textos do jornalismo brasileiro traduz os contos de
um dos principais escritores da literatura americana, o resultado só
pode ser um livro que dê muito
prazer.
É o caso de "24 Contos de F.
Scott Fitzgerald", traduzidos por
Ruy Castro. Cada uma dessas pequenas histórias é um absoluto
deleite. Se não fosse por outro
motivo, pela possibilidade de
apreciar a beleza do domínio sobre a língua.
Mas não que essa seja a sua única qualidade. F. Scott Fitzgerald
está longe de ser um autor com
preocupações filosóficas (como
Ralph Ellison) ou de grandes proposições políticas (como John
Steinbeck).
Ele foi simplesmente um cronista sagaz de um dos períodos mais
ricos da história dos EUA, a chama Era do Jazz, epíteto cunhado
pelo próprio Fitzgerald para designar os anos da Lei Seca, em que
o país vivia os primórdios de sua
condição de grande potência
mundial e em que ali floresceu
uma geração de intelectuais críticos, criativos e iconoclastas, com
a mente em Paris e o coração na
América.
E não é pouco. Graças aos seus
relatos, nos é possível entender
um pouco aquela geração, talvez a
única comparável, no século 20, à
dos anos 60 em termos de ousadia, transgressão e inventividade.
Quando alguém se depara com
a qualidade literária desses contos, é incrível conceber que Fitzgerald os tenha desprezado como
gênero artístico menor, que o
afastava do romance, este sim, a
seu ver, nobre.
Ele escrevia contos para saldar
dívidas e manter, com sua querida mulher, Zelda, o estilo de vida
grandiloqüente a que se habituara
tanto na infância, proporcionado
pelo pai, que depois fracassou
economicamente, quanto na juventude, graças ao precoce sucesso do primeiro romance, "Este
Lado do Paraíso", que o transformou em celebridade do circuito
artístico de seu tempo.
Fitzgerald ganhava até US$
4.000 por conto, pagos por revistas como "Saturday Evening
Post", uma soma extraordinariamente alta para a época. É de supor que ele não dedicasse muito
esforço nesse trabalho que desprezava, e é surpreendente como,
apesar disso, ele possa ter tantas
virtudes.
Ruy Castro selecionou 24 entre
os 43 contos que apareceram na
edição intitulada "Short Stories of
F. Scott Fitzgerald: A New Collection", organizada por Matthew
Bruccoli, professor da Universidade da Carolina do Sul, considerado a maior autoridade acadêmica na obra de Fitzgerald nos
EUA (e também seu biógrafo e
curador). No total, Fitzgerald publicou cerca de 160 contos.
Muitos deles, a maioria entre os
24 que Castro escolheu, como o
tradutor realça em seu breve e
preciso prefácio a essa edição, tratam da questão que provavelmente foi a mais dramática que o autor enfrentou: a perda (da juventude, da beleza e do dinheiro).
É o que descreve "O Amor à
Noite", que Ruy Castro revela ser
o seu preferido entre os 24, uma
pequena obra-prima de delicadeza sobre o romance juvenil de um
entediado mestiço da nobreza
russa com a afluência americana
que tudo perde com a revolução e
a guerra e vive da fugaz lembrança de uma noite de primavera
(quase verão) em Cannes.
Devoráveis
Mas também é o que se passa no
(modestamente) meu preferido,
"Um Belo Casal", em que o par
perfeito da adolescência é desfeito
primeiro pelas agruras da economia e da incompatibilidade de gênios e depois pelas da guerra.
Ou em "Babilônia Revisitada", a
peça mais famosa do grupo, objeto de incontáveis teses de pós-graduação e que, segundo o autor,
propaga o fim da gloriosa fase da
década de 20 e anuncia o trágico
período da Depressão, em que o
bastão de cronista da América
passaria de suas mãos para as de
Steinbeck.
Os 24 contos de Fitzgerald são
todos extraordinariamente gostosos, devoráveis em umas tantas
poucas horas se possível, sonhos
breves que algumas sociedades
vivem de vez em quando e que,
apesar de curtos, as transformam
para melhor por muitos e muitos
anos.
Carlos Eduardo Lins da Silva é jornalista e diretor da Patri Relações Governamentais e Políticas Públicas
24 Contos de F. Scott Fitzgerald
Autor: F. Scott Fitzgerald
Tradutor: Ruy Castro
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 36,50 (480 págs.)
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