São Paulo, quinta, 2 de outubro de 1997.




Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

PERSONALIDADE
Argentino naturalizado brasileiro, artista teve insuficiência respiratória, ontem, às 22h, em Salvador
Morre o pintor Carybé, aos 86, na Bahia

LUIZ FRANCISCO e
CHRISTIANNE GONZÁLEZ
da Agência Folha, em Salvador

O pintor Carybé, argentino naturalizado brasileiro, morreu às 22h de ontem em Salvador (BA) de insuficiência respiratória e parada cardíaca, segundo seu médico particular, Otávio Messede.
De acordo com o médico, o artista plástico argentino estava participando de uma reunião no terreiro de candomblé Ilê Axé Opô Afonjé, no Retiro (periferia de Salvador), quando sentiu-se mal. Ele era adepto do candomblé.
Carybé foi levado para o hospital Roberto Santo -centro médico mais próximo do local onde se encontrava. Messede disse que Carybé já chegou morto ao hospital.
Radicado na Bahia há quase 50 anos, Carybé era ogã (espécie de conselheiro) do terreiro Ilê Axé Opô Afonjé. Messede, que acompanhou Carybé nos últimos nove anos, disse que o artista plástico sofria de problemas respiratórios. "Ele estava muito debilitado e tinha enorme dificuldades para respirar."
O enterro do artista plástico deve acontecer na manhã de hoje, no cemitério Jardim da Saudade, em Salvador. Até as 23h30 de ontem, o corpo de Carybé permanecia no hospital Roberto Santos, sendo velado por amigos e pela filha Solange Barnabó. Segundo informações do diretores da Associação de Cultos Afros da Bahia, os terreiros de candomblé de Salvador ficarão de luto por uma semana.
Hector Júlio Páride Bernabó, Carybé, nasceu em 9 de fevereiro de 1911, em Lanús, subúrbio de Buenos Aires, capital da Argentina. Fez os estudos primários em Gênova e Roma, na Itália, e os secundários no Rio, onde esteve pela primeira vez em 1919.
Após viajar durante anos pela América do Sul -Argentina, Paraguai, Bolívia, Peru-, produzindo e expondo, fixou-se na Bahia a partir de 1950, ano em que participou pela primeira vez do Salão Bahiano de Belas Artes. Tornou-se depois brasileiro naturalizado.
Durante os anos em que viveu na Bahia, desenvolveu profunda relação com a cultura e os artistas do Estado. As manifestações culturais locais -como candomblé, capoeira e baianas- passaram a marcar sua obra.
Como artista plástico, Carybé experimentou ao longo de sua vida uma grande variação em suas formas de trabalho. Escrevendo sobre sua obra em 1966, ele registrava: "Tenho 40 anos de ofício, durante os quais estudei e trabalhei em quase todas as técnicas conhecidas, da encáustica a fogo à cerâmica, do óleo às resinas sintéticas...".
O artista ilustrou obras de importantes escritores, como Jorge Amado, Rubem Braga e Gabriel Garcia Marquez. Realizou também roteiros gráficos, direção artística, cenografia e figurinos para teatro e cinema.
Jorge Amado
Até 24h de ontem, o melhor amigo de Carybé, o escritor Jorge Amado, não sabia de sua morte.
Segundo a mulher de Amado, Zélia Gattai, Jorge só poderá saber da morte do amigo hoje, na presença do cardiologista Jadelson Andrade. "Carybé era nosso melhor amigo. Uma notícia repentina sobre sua morte certamente abalaria muito a Jorge."
De acordo com Zélia Gattai, Carybé estava preparando uma série de 18 telas. A escritora disse que ele estava muito feliz por poder terminar as obras.
"O médico de Carybé o havia proibido de subir escadas, o que o impossibilitava de ir até seu ateliê no segundo andar da casa."
Os Amado estiveram reunidos com o artista plástico no último sábado para comemorar o dia de Cosme e Damião. Carybé havia feito uma pintura com guache com as figuras de Cosme e Damião com o rosto de Jorge Amado e dele próprio. A pintura foi utilizada no convite para o almoço em homenagem aos santos, oferecido por Amado e Gattai.



Texto Anterior | Próximo Texto | Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.