São Paulo, sexta-feira, 02 de novembro de 2007

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Música - Crítica/"A Gente Ainda Não Sonhou"

Brown abusa da sintaxe em novo disco

Em "A Gente Ainda Não Sonhou", cantor baiano se perde em jogo de palavras; disco remete à calmaria dos Tribalistas

JOSÉ FLÁVIO JÚNIOR
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Até os 43 segundos da primeira música, o novo álbum de Carlinhos Brown soa como o de qualquer banda contemporânea de indie rock. Violão folk, vocal angustiado, versos (em inglês) sobre isolamento... Até que chega o refrão: "Blim blom, metrô/I say goodbye hello". Sim, Carlinhos Brown ainda é Carlinhos Brown. As letras involuntariamente psicodélicas aparecem a todo instante em "A Gente Ainda Não Sonhou", seu quinto disco-solo. Mas essa sua irreverência em compor mais preocupado com a sonoridade da(s) língua(s) do que com o sentido não combina muito com a placidez musical do registro.
"A Gente Ainda Não Sonhou" remete à calmaria dos Tribalistas. Nada a ver com seu último disco de inéditas, o animado e divertido "Carlinhos Brown É Carlito Marrón" (2004), nem com as interessantes pesquisas sonoras de sua compilação "Presents Candombless" (2005). A última faixa, inclusive, é uma espécie de canção de ninar chamada "Mande um Email pra Mim", feita com Arnaldo Antunes e Marisa Monte.
Só que, diferentemente de Marisa, Brown não é um bom cantor. E essa deficiência ele não consegue compensar tocando todos os instrumentos em alguns números. "Te Amo Família" é dessas em que Brown faz de tudo. Mas até que nela e em "Guaraná Café" chega a entusiasmar com suingue.
Uma pena o resto do disco ser tão aborrecido, modorrento, arrastado. Se sabidamente não vive um de seus melhores momentos em termos comerciais, o baiano também não exibe a criatividade de outrora, quando ousaram identificá-lo como gênio da música popular brasileira. O mais difícil é aturar os jogos de palavras que mesclam a língua portuguesa com a inglesa, uma obsessão desse acrobata da sintaxe. A soul "Everybody Gente" é exemplo disso. E oito das 11 faixas trazem pelo menos uma passagem em inglês.
O fato é que o músico não engana mais o grande público nem a parcela da mídia que divulgava seu talento na década passada sem qualquer freio. Já ficou claro que ele funciona muito melhor quando envolvido em projetos coletivos. Sozinho, é capaz de defender coisas como a delirante "Garoa": "Se o riso fosse mato pro milho crescer/Garoa, garoa, garoa, roa, garoa/Sujeira no espelho creme dental e cabelo".


A GENTE AINDA NÃO SONHOU
Artista:
Carlinhos Brown
Gravadora: Som Livre
Quanto: R$ 30, em média
Avaliação: ruim


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