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"QUERO SER MÃE"
Obra mostra lado material da maternidade moderna
MARILENE FELINTO
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
A maternidade moderna
pode ter um outro lado, menos natural do que se imagina,
mais caso clínico do que a ciência
poderia prever até pouco tempo.
Pode custar entre US$ 2.000 e
US$ 6.000 para se realizar.
Pode levar anos para acontecer
e pode doer muito mais do que as
já apavorantes dores do parto.
Todo o processo é artificial: da
ejaculação do parceiro, na base da
masturbação solitária em laboratório, a doloridas injeções de hormônio, punções, angústia da espera por misteriosas siglas (ICSI
ou FIV) que funcionem e mesmo
gravidez múltipla ou de alto risco.
A vida real de alguns casais que
já enfrentaram esse drama contra
a infertilidade é que virou objeto
dessa pesquisa da jornalista Cláudia Colluci. Depois de ouvir o depoimento de 40 mulheres, Colluci
narrou a trajetória delas a partir
da decisão de engravidar por
meio de técnicas de reprodução
assistida. O texto flui como num
romance de suspense, em que o
antagonista a ser vencido é sempre a poderosa infertilidade.
O mais tocante na narrativa é
mesmo a maneira pessoal como
essas mulheres expõem sua história. Das mais famosas e ricas como Fátima Bernardes -a locutora do "Jornal Nacional" da Globo- a anônimas como Ana Lúcia, que precisou do serviço de assistência social da prefeitura de
sua cidade para o tratamento.
Segundo Colluci, um em cada
seis casais brasileiros não consegue ter filhos. Sendo que, em um
quinto desses casos, não há um
motivo aparente. Muitos recorrem mais de uma vez a um centro
de reprodução, e a gravidez só é
obtida depois de uma fertilização
in vitro (FIV), uma injeção introcitoplasmática de espermatozóides (ICSI) ou outros métodos
mais radicais como por meio de
doação de óvulos ou esperma.
Muitos enfrentam a longa e abstrata espera de manter por meses
embriões congelados num laboratório, preconceitos internos e
externos, da família, da bioética e
da Igreja Católica.
Mais do que revelar os meandros desse mundo clínico dos bebês de proveta e do congelamento
de embriões, "Quero Ser Mãe"
abre espaço para o questionamento da própria maternidade.
Afinal, o que tem do velho "instinto maternal" no "projeto-filhos" de Ester, por exemplo, que
investiu cerca de US$ 170 mil nas
várias tentativas de engravidar?
Até que ponto o desejo de ser
mãe não passa de planejamento
racional, que leva em conta a economia das heranças materiais,
mais do que da genética? E o que
quer essa mulher do século 21,
que, apesar de tanta ciência e desejo de igualdade e independência, leva a imagem de Nossa Senhora Aparecida para a maca do
laboratório de reprodução?
Quero Ser Mãe
Autora: Cláudia Colluci
Editora: Palavra Mágica
Quanto: R$ 29 (143 págs.)
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