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'Bimbo' americano pode mudar o destino nacional
ARNALDO JABOR
da Equipe de Articulistas
Tenho pensado muito no
"bimbo" do Clinton, como
dizem os jornais em NY, para
usar uma palavra mais infantil, em vez de "dick" ou
"prick" ou "pecker". Perdoem-me os leitores e tolerem-me editores, mas não posso falar no "pênis" do presidente. No Brasil, que palavra
usar? Pinto, piu-piu, "coisinha", para ser suave, ou então, para ser jocoso, "pele vermelha", "miúda", piroca ou,
engrossando mais, casseta,
manjuba, peia ou a raríssima
"silupanha"? Escolho a palavra "pau", por ser mais neutra, útil, com sonoridade minimalista.
A verdade é que o mundo está todo pensando no pau do
Clinton. Eu ia escrever sobre a
crise da Ásia e acabei reduzido
a falar do voraz habitante de
uma braguilha gringa. É bonito isso? Há duas semanas, só
pensávamos na Coréia, na Indonésia e agora somos três bilhões de seres humanos vidrados nas partes pudentas do
presidente americano e tentando imaginar como seria a
cena entre ele e a chave-de-cadeia Monica Lewinsky.
E pensamos num "pornô-épico": Os dois fazendo amor
em cima da mesa de despachos, perto do telefone vermelho, perto do botão que aciona
40 mil ogivas nucleares e nos
destrói. Os diálogos podem parodiar o "Casabranca",
quando Humphrey Bogart diz,
ao beijar Ingrid Bergman, na
hora da invasão de Paris:
"São os canhões atirando ou
nossos corações batendo?"
Hoje seria: "Você gozou,
amor, ou foi o fim do mundo?"
O pau de Clinton viaja no
imaginário mundial, como um
"passaralho" multicultural.
Como será essa superpotência
nuclear? Paula Jones descreveu-o como "torto, com uma
cicatriz do lado". E a assessoria da Casa Branca desmentiu:
"o pênis do sr. presidente é
normal". Como será? Terá o
selo da república americana?
Será verde como o dólar, será
um "star spangled" pinto,
com listras e estrelinhas como
a bandeira? Afinal, o pau do
presidente americano é o pau
mais importante do mundo e
seu bem-estar é fundamental
para a nossa segurança. Segundo algumas assessoras (isto
está nos jornais), Clinton tem
uns ataques de súbita libido
que elas chamam carinhosamente de "bimbo eruptions"
("erupções do bimbo"). Ou
seja, ele está tentando acalmar
esse vulcão e, se ele sabe o que
deve fazer para manter a paz
no Oriente Médio, deve também saber o que fazer para
manter sua paz interior. Ficou
apavorantemente claro para o
mundo que um "atraso"
qualquer no "bimbo", um excesso de trabalho, uma insatisfação orgástica, pode provocar
guerras e crises. Ficou clara a
tibieza ridícula do mundo moderno e seu mito do controle
absoluto. O descontrole de um
"bimbo" é um terremoto histórico. Por baixo do mundo globalizado, vemos que a velha
sexualidade freudiana ainda
manda. Ficou claro que o
mundo, moralista e vulgar, só
pensa "naquilo". Como dizia
Nelson Rodrigues, "o Ser Humano é de classe média". Uma
das imagens mais incríveis da
semana foi o encontro de Clinton e Arafat, ali no salão Oval
(ou Oral), onde tudo aconteceu, com a imprensa ignorando o líder palestino e perguntando ao Clinton sobre seu
pinto. Ninguém traduziu nada
para o Arafat e o pobre árabe
ficou perplexo, ele mesmo com
cara de piroca, ainda por cima
com aquele paninho amarrado
na cabeça, mais parecendo um
"bimbo" de capuz.
Estaria Monica Lewinsky fazendo um bem ou um mal para
a humanidade, ao praticar
"blow jobs" no grande homem, o "big he", como ela
chama, numa súbita metonímia sexy (refere-se à parte ou
ao todo?). O que é melhor para
a humanidade: um presidente
ativo, comedor, machista, como dizem as americanas (o
monstruoso dragão Linda
Tripp falou: "estou agindo
contra o machismo liberal")
ou um presidente brocha ou reprimido? Esse debate é maior
que a mentira ou a verdade.
Aqui nos EUA só há duas hipóteses: ou você é liberal ou conservador. Não há paus-tucanos, paus-PFL, paus-Lula ou
paus-Maluf, paus cambiantes,
evasivos, conciliatórios. Só há
dois paus: o castrado e o delirante, o carta ou o priapico, o
voltejante, o lúdico pau dos democratas com grandes sacanas
históricos como o presidente
Harding (1921-1923), como
Roosevelt e sua amante, passando pela Marilyn Monroe
cantando "happy birthday"
para o Kennedy, (que, aliás,
comeu uma brasileira amiga
minha, que lhe fez um "serviço de sopro" num iate que jogava muito e ela ficou enjoada,
mas teve de engolir -afinal,
seria uma desfeita para com o
líder de uma nação amiga...),
até chegarmos a esta coisa sinistra e pós-moderna de um
pobre estadista tendo de dar
escapadinhas no salão Oval,
como um clandestino da lei,
um clandestino de si mesmo.
E há esse embate entre Clinton e esta bicha enrustida que
é o promotor Kenneth Starr,
que ama o presidente, sem dúvida, tal sua sanha vingativa.
Starr quer castrar o homem
que toca sax, que já fumou
maconha, se recusou a ir ao
Vietnã; a boneca republicana
quer capar esse yuppie com vagos ecos dos anos 60. É isto que
a caretice puritana deseja: secar o lado alegre da América, o
lado (hoje quase nada) inconformista, o lado jazz, o lado
rock, o lado riso, o lado "bimbo".
Por fim, o "bimbogate"
mostra que nós, jornalistas,
não somos livres coisa nenhuma, que somos pautados pelos
poderosos -o mundo inteiro
está submetido a este pornofilme. Assim como os EUA tinham decidido no último mês
que só a crise financeira interessava à imprensa mundial,
agora somos obrigados, humilhantemente, a comentar uma
besteira desse tipo.
Será que estamos no início
ou no fim de uma revolução
cultural? Será um ridículo fim
de século ou estamos nos "humanizando" pela crise do pintinho? Talvez seja o início, talvez estejamos comendo "ab
ovo", dos ovos, do oval, do
oral, do anal, numa retomada
freudiana que desfaz todos os
mitos de "grandeza" de uma
civilização neurótica e burra.
Que diria um Weber, que dirá um Habermas, diante de tal
micharia? Como ficam os sistemas de pensamento? Como explicar a convivência da maior
nação do mundo com esta bobagem, a convivência do Hubble com o Bimbo? "Foi a CIA
que armou tudo, para empanar a visita do papa a Cuba",
disse-me um amigo comuna,
num derradeiro gesto de esperança épico-conspiratória.
Coitado, já acabaram as
"grandes narrativas".
Até o Sadam Hussein está revigorado com essa provisória
castração de Clinton, ameaçando o mundo com seu
pau-fundamental, com micróbios "antrax" e botulismos
pavorosos, numa espécie de gonorréia maldita, nessa guerra
fria de micharias como a Aids,
ébola, gripe de galinhas chinesas, foguetes cheios de merda
caindo em Nova York e agora o
pinto pelado e torto de Clinton
sendo defendido por sua própria mulher enganada. O pau
de Clinton transformou nossa
tragédia numa piada sinistra.
O teatro do absurdo acabou
num terrível besteirol. E no
Brasil, que cenário temos? Vejamos. Crise do "bimbo" derruba Bolsas, causa pânico, fuga de capitais, fracasso do Real
e falência nacional. Deixaremos de ser emergentes para decadentes. É isto aí... Monica
Lewinsky pode ter determinado nosso destino nacional, oh,
meu pálido leitor!
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