São Paulo, segunda-feira, 03 de abril de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

CRÍTICA

Charme de álbum está no "malabarismo poético"

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local

"Cole Porter & George Gershwin - Canções, Versões", álbum "orquestrado" por Carlos Rennó, talvez seja mais um livro que um disco. Grande parte de seu charme está nos malabarismos poéticos operados para transformar tais composições em MPB.
Causa estranhamento, mas soa instigante -ousado até- tomar "It's De-Lovely" por "Que De-Lindo", "Let's Do It" por "Façamos", "Embraceable You" por "Abraçável Você", "The Lorelei" por "A Lorelai", "The Laziest Gal in Town" por, bem coloquial, "A Moça Mais Vagal da Cidade"... As liberdades avançam pelo corpo das letras, para lá dos títulos.
Mas é um disco e, como tal, bastante pesado. Os arranjos de Dori Caymmi e Nelson Ayres optam, sempre, pelo solene, pelo orquestrado -são menos MPB que as versões das letras, por estranho que pareça.
As interpretações, todas elas buscando o "cool", fazem a ponte pênsil entre Cole Porter e os irmãos Gershwin (por que Ira perdeu lugar no título?) e nossa bossa nova, que nem sempre é tão evidente nos domínios dos arranjos.
Bem bossa nova são os arranjos de "Um Dia de Garoa" (A Foggy Day), por Dori Caymmi e com Gilberto Gil, num encontro histórico de facções que se opuseram no cisma do tropicalismo, e de "Que De-Lindo", por Cláudio Leal Ferreira e com Caetano Veloso, de contato com "Amoroso" (77), de João Gilberto, arranjado por Claus Ogerman.
Divergente do contexto, por linhas tortas, é "Você É o Mel", versão divertidíssima (e muito abrasileirada) de "You're the Top", cantada por Tom Zé e arranjada pelo herdeiro tropicalista Ruriá Duprat, naqueles conformes. É o ponto alto do disco, com as intervenções de Elza Soares em "Façamos (Vamos Amar)", dueto com Chico Buarque.
As leituras solenes causam choques quando "divas" pop (isso existe?) encontram as orquestras. Rita Lee em "Blablablá (Blah, Blah Blah)", Cássia Eller em "Toda Vez Que Eu Digo Adeus (Ev'ry Time We Say Goodbye)", Paula Toller em "Quem Tome Conta de Mim (Someone to Watch Over Me)", Sandra de Sá em "Enfim o Amor (At Long Last Love)", Zélia Duncan em "Eu Só Me Ligo em Você (I Get a Kick Out of You)" usam o escudo da voz para lutar contra o roubo de suas camas pop.

"Oh, Dama, Tem Dó"
Mais adaptados soam Carlos Fernando (provavelmente a grande interpretação no CD), em "Oh, Dama, Tem Dó (Oh, Lady, Be Good)", Mônica Salmaso em "A Lorelai", Jussara Silveira, em "A Moça Mais Vagal da Cidade", até os muitas vezes excessivos Ed Motta, em "Fascinante Ritmo (Fascinating Rhythm)", e Jane Duboc, em "Abraçável Você".
Bem, esses são os músicos, e, talentos à parte, o conjunto roça o moroso um bom tanto de tempo. Mas aí há, de novo, as versões.


Avaliação:    

Disco: Cole Porter & George Gershwin -Canções, Versões
Intérpretes: Mônica Salmaso, Carlos Fernando, Tom Zé e outros
Lançamento: Geléia Geral/WEA
Quanto: R$ 20, em média


Texto Anterior: Gershwin e Porter sem legendas
Próximo Texto: "A foggy day"
Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.