São Paulo, sexta, 3 de abril de 1998

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Filme é inventário do negro no cinema

EDUARDO SIMANTOB
especial para a Folha

O cinema americano precisou de quase cem anos até começar a fazer justiça com as minorias que, historicamente, foram por ele estereotipadas e segregadas.
No caso dos homossexuais, algumas iniciativas partem da própria indústria, como os filmes "Filadélfia", o recente "Será Que Ele É?" ou mesmo o documentário "Celulóide Secreto".
No caso dos negros, a questão é mais complicada. Já nos filmes do mestre D.W. Griffith era comum vermos negros em papéis constrangedores, caracterizados como um estágio da evolução entre o chimpanzé e o "homo sapiens".
Só nos anos 70 o cinema negro americano -filmes feitos por negros, com temas e linguagem próprios- começou a levantar a cabeça, a ponto de já poder se orgulhar de algumas estrelas: Sidney Poitier, Spike Lee, John Singleton, Melvin e Mario van Peebles etc.
Estes últimos são os responsáveis pelo documentário "Classified X - O Cinema Negro Segundo Melvin van Peebles", exibido hoje dentro do festival de É Tudo Verdade (veja programação acima).
Mais que um documentário, o filme faz um pequeno inventário de cenas cuidadosamente pescadas do cinema americano, expondo a ridícula condição dos negros retratados ao longo de décadas.
O discurso de Melvin van Peebles é forte, indignado, mas deixa uma impressão de que ficou faltando uma parte. Somos transportados à miséria da condição negra nas telas, porém o documentário chega a ser displicente ao abordar a reação e surgimento de uma "estética afro-americana".
"Classified X" poderia ser um filme-denúncia, caso registrasse atitudes racistas ainda correntes. Mas, por mais racista que ainda seja em sua raiz, a sociedade e a indústria cinematográfica dos EUA pisam em ovos ao tratar de e caracterizar minorias.
Ficamos, assim, esperando uma virtual "segunda parte". Aquela que enfim contaria a atitude altiva, orgulhosa e revoltada de filmes que nada devem aos seus pares brancos e que nos proporcionam um ponto de vista original, do lado de dentro do gueto.



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