|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ENSAIO
Brasil festeiro nasce de hinos
religiosos e marchas militares
SYLVIA COLOMBO
EDITORA DE ESPECIAIS
As festas populares do Brasil nasceram de brechas deixadas pelas celebrações de cunho
religioso ou oficial durante a Colônia. Em "As Festas no Brasil Colonial" (editora 34), o pesquisador e crítico musical José Ramos
Tinhorão estuda esse processo,
usando documentos de época.
Para observar o século 16, Tinhorão apoiou-se nas cartas dos
jesuítas e nos relatos dos primeiros viajantes que aqui chegaram.
Para o 17, usou cronistas estrangeiros, documentos do governo e
da Inquisição, sermões e folhetos
de cordel. Para o 18 e o 19, obras
de doutrinação religiosa e documentos oficiais.
Tinhorão principia relatando a
primeira "festa" do Brasil, logo
depois da chegada dos portugueses, em abril de 1500, levada pela
gaita de Diogo Dias, membro da
frota de Cabral e personagem da
carta de Pero Vaz de Caminha.
Ressalta que os primeiros sons a
serem propagados em terras brasileiras vieram do interior de Portugal, uma vez que os membros
da tripulação originavam-se do
êxodo rural pelo qual passava a
metrópole naquele momento.
Por meio das citações dos relatos, Tinhorão mostra como os jesuítas utilizaram a música e a língua dos índios para catequizar,
contribuindo assim para a dilapidação paulatina de sua cultura.
A partir da premissa de que os
primeiros tempos da colonização
tiveram apenas momentos de
"sociabilidade festiva" propiciados por efemérides do Estado ou
pelo calendário religioso, o autor
passa a descrever os diferentes
momentos de cada modalidade
de celebração na história.
Sobre as manifestações oficiais,
explica que seu caminho remonta
à tradição medieval européia
-marcada por exercícios equestres, torneios, cavalhadas-, e que
possuíam elementos que prenunciariam a folia carnavalesca.
Para Tinhorão, a difusão das
festas religiosas pelas ruas aconteceu porque a igreja teve necessidade de deixar o espaço do culto
para entrar em contato com a população. A encenação bíblica foi a
forma usada para aproveitar uma
tendência à participação social.
O autor mostra que os holandeses não contribuíram para a introdução de festividades no período colonial, comportando-se
como espectadores das folias da
população. Lembra, porém, de
um episódio curioso da passagem
de Maurício de Nassau por Recife,
que originou o que ficou conhecido como a festa do Boi Voador.
Ao inaugurar a ponte sobre o
rio Capibaribe, em 1644, Nassau
criou um artifício para levar a população a pagar um pedágio na
ponte. Divulgou a notícia de que
um boi voador poderia ser visto
por quem fosse à inauguração.
Para realizar o "milagre", substituiu um boi de verdade por outro
de palha, seguro por uma corda.
"As Festas no Brasil Colonial"
registra os momentos da inserção
popular nos eventos lúdicos do
Estado e da igreja e como isso deu
forma às manifestações de rua
que surgiriam com o tempo.
O relato dos documentos de
época permite refazer parte das
cenas que tomaram as ruas, ainda
que, para Tinhorão, boa parte dos
sons que animaram aquelas festas
tenha sido perdida para sempre.
As Festas no Brasil Colonial
Autor: José Ramos Tinhorão
Editora: 34
Quanto: R$ 15 (173 págs.)
Texto Anterior: Livros/Lançamento - Memória: Zélia relembra saga dos Gattai Próximo Texto: Romance: Anti-herói pratica a ira vingadora dos anônimos Índice
|