São Paulo, sábado, 03 de junho de 2000


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ENSAIO
Brasil festeiro nasce de hinos religiosos e marchas militares

SYLVIA COLOMBO
EDITORA DE ESPECIAIS

As festas populares do Brasil nasceram de brechas deixadas pelas celebrações de cunho religioso ou oficial durante a Colônia. Em "As Festas no Brasil Colonial" (editora 34), o pesquisador e crítico musical José Ramos Tinhorão estuda esse processo, usando documentos de época.
Para observar o século 16, Tinhorão apoiou-se nas cartas dos jesuítas e nos relatos dos primeiros viajantes que aqui chegaram. Para o 17, usou cronistas estrangeiros, documentos do governo e da Inquisição, sermões e folhetos de cordel. Para o 18 e o 19, obras de doutrinação religiosa e documentos oficiais.
Tinhorão principia relatando a primeira "festa" do Brasil, logo depois da chegada dos portugueses, em abril de 1500, levada pela gaita de Diogo Dias, membro da frota de Cabral e personagem da carta de Pero Vaz de Caminha. Ressalta que os primeiros sons a serem propagados em terras brasileiras vieram do interior de Portugal, uma vez que os membros da tripulação originavam-se do êxodo rural pelo qual passava a metrópole naquele momento.
Por meio das citações dos relatos, Tinhorão mostra como os jesuítas utilizaram a música e a língua dos índios para catequizar, contribuindo assim para a dilapidação paulatina de sua cultura.
A partir da premissa de que os primeiros tempos da colonização tiveram apenas momentos de "sociabilidade festiva" propiciados por efemérides do Estado ou pelo calendário religioso, o autor passa a descrever os diferentes momentos de cada modalidade de celebração na história.
Sobre as manifestações oficiais, explica que seu caminho remonta à tradição medieval européia -marcada por exercícios equestres, torneios, cavalhadas-, e que possuíam elementos que prenunciariam a folia carnavalesca.
Para Tinhorão, a difusão das festas religiosas pelas ruas aconteceu porque a igreja teve necessidade de deixar o espaço do culto para entrar em contato com a população. A encenação bíblica foi a forma usada para aproveitar uma tendência à participação social.
O autor mostra que os holandeses não contribuíram para a introdução de festividades no período colonial, comportando-se como espectadores das folias da população. Lembra, porém, de um episódio curioso da passagem de Maurício de Nassau por Recife, que originou o que ficou conhecido como a festa do Boi Voador.
Ao inaugurar a ponte sobre o rio Capibaribe, em 1644, Nassau criou um artifício para levar a população a pagar um pedágio na ponte. Divulgou a notícia de que um boi voador poderia ser visto por quem fosse à inauguração. Para realizar o "milagre", substituiu um boi de verdade por outro de palha, seguro por uma corda.
"As Festas no Brasil Colonial" registra os momentos da inserção popular nos eventos lúdicos do Estado e da igreja e como isso deu forma às manifestações de rua que surgiriam com o tempo.
O relato dos documentos de época permite refazer parte das cenas que tomaram as ruas, ainda que, para Tinhorão, boa parte dos sons que animaram aquelas festas tenha sido perdida para sempre.


As Festas no Brasil Colonial     Autor: José Ramos Tinhorão
Editora: 34 Quanto: R$ 15 (173 págs.)





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