São Paulo, sábado, 03 de julho de 2010

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livros

CRÍTICA ROMANCE

Lodge faz divertidíssimo tratado a respeito de um mundo doente

MARCELINO FREIRE
ESPECIAL PARA A FOLHA

- Quem?, eu perguntei.
- Lodge.
- Jim Dodge?
- Não, David Lodge.
Confusão na audição. Ao telefone. Não. Não era o autor de "Fup". Fui convidado para escrever na Folha sobre o autor de "A Arte da Ficção" -esse, o único livro que li deste premiado ficcionista inglês nascido em 1935.
- Lodge acaba de lançar o romance "Surdo e Mudo". É a história de um professor aposentado e a sua luta contra a velhice e a surdez.
Oba! Quase gritei. Gosto de aventuras decrépitas. Desventuras patéticas e caducas. Uma horinha depois da conversa acima, o livro chegou.
Um calhamaço de mais de 300 páginas. E que eu li de uma arrancada só, para o meu espanto. Divertidíssimo, irônico, inventivo.
Um tratado sobre a deficiência auditiva e outras deficiências à vista. Quando chega o cansaço. E o tempo impiedoso. Sobretudo para quem precisa, repetidas vezes, da paciência dos outros.
- O quê? O que você falou?
Hilárias e comoventes são as trapalhadas do protagonista Desmond Bates, o tal professor. De linguística.
Ele reclama em alto e bom som: "Não temos nenhum sinal visível que desperte a compaixão alheia".
No caso de Bates, eis que aparece Alex, uma problemática e gostosa aluna, toda-ouvidos, que o convida para orientá-la em um doutorado. A saber: "Uma análise estilística de bilhetes de suicidas".
- Como? Não entendi.
Não dá para explicar. Nem para resumir. O tanto de mal-entendidos que percorre a vida do coitado do velho. Os ruídos na comunicação, os diálogos que não dialogam. A falência múltipla de órgãos. Sistemas e pilhas. Ecos de um mundo assim, digamos, cada vez mais doente. E individualista. Quem escuta quem hoje em dia?
- Quem? Hein? Me diga.

MARCELINO FREIRE é autor, entre outros, do livro de contos "RASIF - Mar que Arrebenta" (Record)



SURDO E MUDO
AUTOR David Lodge
TRADUÇÃO Guilherme da Silva Braga
EDITORA L&PM
QUANTO R$ 49
AVALIAÇÃO ótimo


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