São Paulo, sábado, 3 de outubro de 1998

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A HISTÓRIA DA ESTATAL
Negociatas pelo "ouro negro" fluem em ritmo noir

da Reportagem Local


Depois de 30 anos no subsolo dos quiproquós jurídicos da Petrobrás, o advogado Ilmar Penna Marinho Júnior, 59, se aposentou e emerge com uma ficção sobre as politicagens e negociatas do "nosso" ("deles") petróleo.
"Águas Profundas" começa, para situar o leitor e servir de reflexão a um dos personagens, com um resumo da "Mani Pulite", a famosa operação "Mãos Limpas" realizada pelos promotores italianos para combater a corrupção no país.
Daí por diante, conhecemos, em ritmo de aventura noir, o submundo da estatal e as relações do seu alto escalão com parlamentares e executivos nacionais e estrangeiros interessados no "ouro negro".
Na ficção, a Petrobrás chama-se Enerbras. E o livro mostra, com gente de carne e osso por trás das ações, todo o processo político que nasce na Constituição de 1988, quando é derrubado o monopólio de exploração de petróleo, até os negócios futuros da estatal.
O livro é absolutamente minucioso. Do lobby movido a muito sexo (garotas, como se sabe em Brasília, são decisivas em concorrências públicas) ao funcionamento do mercado internacional dos combustíveis. O autor domina a cultura "business", o que transmite autenticidade nos diálogos.
Outra vantagem do livro é que Marinho Jr. não teve vergonha de tentar mesmo escrever um best-seller, com tudo a que tem direito, sobre um mundo em que viveu.
Com mais apuração na técnica, vai juntar-se, logo mais, a Ivan Sant'Anna, autor de "Rapina" e "Os Mercadores da Noite" (editora Rocco), que faz sucesso ao romancear as falcatruas e labirintos do mercado financeiro. Assim como Sant'Anna, Marinho Jr. não escreve para ficar na galeria dos grandes escritores brasileiros, como Graciliano Ramos, mas enriquece a pobre fileira nacional dos ficcionistas de entretenimento.
Faz, de um tema aparentemente chato, um livro que diverte. Tem até receita de um "penne al Giardino del Paradiso". Livro sobre máfia sem macarrão não vale a pena, mesmo na terra da feijoada.
O autor de "Águas Profundas" poderia, no entanto, ser mais inventivo no subtítulo do livro: "O Petróleo É Nosso?" pode apontar, de imediato, para a leitura de um panfleto nacionalista, o que não é o objetivo do livro -dedicado apenas a contar uma história.
Por falar em grande história, qualquer pretendente a escrever ficção a partir de fatos reais tem um novo modelo: "Dinheiro Queimado", do argentino Ricardo Piglia (Companhia das Letras).
O escritor transformou a banalidade policial de um assalto a banco, ocorrido em 1965 nos arredores de Buenos Aires, em uma tragédia que faz de "Cães de Aluguel" um filme para crianças. (XS)
˛

Livro: Águas Profundas
Autor: Ilmar Penna Marinho Jr.
Lançamento: Revan
Quanto: R$ 24 (224 págs.)




Texto Anterior | Próximo Texto | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.