São Paulo, sábado, 03 de novembro de 2001

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LIVRO/LANÇAMENTO

Do início ao fim


Recente evolução da física é contada por Stephen Hawking em "O Universo em uma Casca de Noz"


JESUS DE PAULA ASSIS
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Desde que, em 1988, o físico britânico Stephen Hawking lançou seu "Uma Breve História do Tempo", a divulgação científica ganhou um novo ícone. Como podia aquele homem preso a uma cadeira de rodas, mal e mal balbuciando umas sílabas incompreensíveis, desvendar os segredos do Universo ou, mais grandiosamente -como previa no último capítulo daquele livro- ,"chegar a conhecer a mente de Deus"?
Desde então, a física e Hawking evoluíram. E a história recente dessa evolução é contada no muito mais ilustrado "O Universo em uma Casca de Noz", lançado no Brasil pela editora Mandarim. A "Breve História" carecia de boas ilustrações e, no fundo, de inteligibilidade. Esse problema, na verdade, continua, mas temperado com uma apresentação muito mais televisiva.
De fato, a contribuição de Hawking para a física -muito desproporcional à sua notoriedade entre o leitor leigo- pode ser creditada à demonstração de uma série de soluções que unem relatividade e mecânica quântica, duas teorias tão incompreensíveis quanto correntes.
Em resumo: matéria atrai matéria. É por isso que os objetos do dia-a-dia estão presos à superfície deste planeta. Mas e se um dos blocos de matéria for incrivelmente maciço? Ele atrairia tudo, inclusive luz. Resultado, seria invisível. Tudo o que passasse perto dele "cairia" em um buraco infinitamente voraz, negro. Entra em cena Hawking, em fim dos anos 60, início dos 70, para mostrar que as coisas podem não ser bem assim. Ou seja, pode ser que buracos negros emitam partículas e, com o tempo, evaporem-se.
Dado que (pelo menos é o que os físicos dizem) o Universo começou em uma bolinha extremamente densa (de novo, em um buraco negro), a solução de Hawking informa que esse início pode ter sido menos drástico. Não foi bem uma sequência "nada-explosão-Universo", mas "quase nada-expansão-Universo". Em outras palavras: não houve bem um início, mas um lento evaporar, seguido de uma explosão. O Universo nunca teria começado. Esse foi o tema da "Breve História".

Zoológico cósmico
Depois disso, ganharam mais relevo entre os físicos os estudos que afirmam que o Universo não é apenas um monte de outrora simples prótons, nêutrons, fótons e mais um punhado de particulazinhas. Não. Aparecem supercordas, branas, cordas cósmicas, possibilidade de viagens no tempo etc. etc. etc. Esse zoológico cósmico é o assunto de "O Universo em uma Casca de Noz".
Embora divulgação científica exista desde o século 19, é com Albert Einstein que ela ganha impulso. De repente, o público queria muito saber o que aquele homem havia proposto, ou melhor, descoberto. E não faltou gente que pretendesse explicar a relatividade. O sucesso dessas gerações de explicadores pode ser atestado no singelo "tudo é relativo", que resume para o leigo o que a teoria quer dizer.
Mas o fato é que, perto das branas e cordas cósmicas, a relatividade e a mecânica quântica, duas teorias que se aproximam de um século de existência, são simples.
O que se procura hoje entre os físicos é uma fugidia "teoria-mãe", da qual relatividade e todo o resto são apenas casos especiais. Para encurtar: é impossível entender o que, hoje, os físicos teóricos fazem. E isso, diga-se, não é privilégio de leigos. Mesmo entre os profissionais de física, os temas que Hawking aborda no seu livro não são nada triviais.
Mas quem se importa? Existe uma história que envolve Albert Einstein e Chaim Weizmann, o primeiro presidente do Estado de Israel. Depois de uma viagem juntos pelo Atlântico, este teria dito: "Einstein me explicava sua teoria todos os dias e logo tive plena convicção de que ele a entendia".
E nem por isso as pessoas deixavam de ouvi-lo ou de ler os livros que tentavam explicar suas equações. Vale agora a mesma fascinação, que dispensa completamente a compreensão do que realmente os protagonistas estão discutindo. Resta apenas a esperança -que Weizmann depositava em Einstein, em um gesto cada vez mais difícil de imitar- de que eles se entendam.


O UNIVERSO EM UMA CASCA DE NOZ - ("The Universe in a Nutshell"). De: Stephen Hawking. Editora: Mandarim (tel. 0/xx/11/3649-4600). Tradução: Ivo Korytowski. 224 págs. R$ 35.



Texto Anterior: Drauzio Varella: Raízes biológicas da monogamia
Próximo Texto: Trecho
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.