São Paulo, Sexta-feira, 03 de Dezembro de 1999


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Videoarte ganha vez em SP

Divulgação
"Homenage to Edvard Munch and All My Dead Children", em que Tracey Emin aparece em posição fetal até explodir em um grito


JULIANA MONACHESI
free-lance para a Folha

O artista Mat Collishaw coloca uma venda nos olhos em seu estúdio em Londres. Com a ajuda de uma intérprete espanhola, que registra em vídeo a experiência, segue para o aeroporto e pega um avião para Madri. Chegando à cidade, sempre com os olhos vendados, Collishaw segue com a guia para o Museu do Prado.
O espectador acompanha a bela visão dos lugares por onde o táxi passa, vê a cara do taxista com quem Collishaw conversa longamente, acompanha as reações das pessoas diante de um homem vendado caminhando com dificuldade pelas ruas. Em suma, vê tudo o que o artista não vê.
O motivo da empreitada é apreciar a obra "Las Meninas", do pintor Diego Velázquez (1599-1660), sem interferências visuais, de uma forma como ninguém nunca fez, o que é difícil, considerando que a pintura é das maiores vedetes da história da arte até hoje.
Após apreciar a obra por três minutos no Prado, Collishaw repõe a venda nos olhos e faz todo o percurso de volta ao ateliê da mesma forma. A videoinstalação "Blind Date" (encontro às cegas), em que três projeções mostram separadamente a ida, a volta e o efeito da observação do quadro, poderá ser vista em uma exposição na Casa das Rosas, em São Paulo, na semana que vem.
A mostra "Chiva(s)ynergies Art" é um intercâmbio entre Brasil e Inglaterra, promovido pela marca de uísque Chivas Regal, do qual participaram integrantes do Grupo de Estudos em Curadoria do MAM e a curadora do ICA -Institut of Contemporary Art de Londres, Katya Garcia-Anton.
Katya selecionou o trabalho de Eder Santos, um dos videoartistas brasileiros mais premiados no exterior. Os quatro curadores brasileiros deveriam escolher artistas britânicos, mas Felipe Chaimovich preferiu trabalhar com a obra de Carlos Nader. O único pré-requisito para a seleção dos curadores era que os artistas usassem o vídeo como suporte.
O que nos leva a uma discussão démodé, mas presente: desde quando a videoarte -ou a arte que se utiliza de mídias eletrônicas, para usar uma caracterização mais atual- possui o mesmo estatuto que uma pintura ou uma escultura no universo das artes?
Não é segredo que o público ainda torce o nariz para trabalhos de arte em vídeo. "A gente está agora começando a perceber a fórceps que a videoarte está inserida no circuito de arte há pelo menos uma década no mundo todo. Na área de audiovisual, é o que há de mais desenvolvido no Brasil, mais do que o próprio cinema", afirma Solange Farkas, diretora do Videobrasil, festival internacional de arte eletrônica.
Os trabalhos de Collishaw, Tracey Emin, Sam Taylor-Wood -que participam da polêmica exposição "Sensation", em NY-, Carlos Nader e Eder Santos, que estarão na mostra da Casa das Rosas, são uma ótima amostra do que se tem feito nessa linguagem.
É desconcertante para o espectador, habituado a cem anos da linearidade do cinema, ver um vídeo puramente sensorial. "A videoarte quer despertar sensações, provocar inquietação. A contemplação é para ser equivalente à de uma pintura", diz Solange.
Tracey comparece a dois vídeos autobiográficos, "Cunt Vernacular 1962 to 1995" e "Homenage to Edvard Munch and All My Dead Children". Ela costuma explorar a própria vida em sua obra, relatando os abortos que fez, por exemplo, que é o tema de "Homenage to Edvard Munch...".
O trabalho de Sam Taylor-Wood fica, segundo o curador Marcos Moraes, na fronteira entre ação e atuação. Em "Hysteria", a própria artista aparece oscilando entre o choro e o riso em um vídeo sem som, o que dificulta ainda mais a identificação de seu estado de espírito.
Carlos Nader preparou para a mostra uma obra inédita. "Vento Luz 2" consiste na projeção sobre um imenso ventilador industrial da imagem de dois bailarinos girando sem parar, o que causa no espectador uma dupla vertigem, pelo rodopio e pelo vento. De acordo com o artista, a obra discute a relação do indivíduo com a sociedade mediada pela câmera. "É também sobre a idéia de virtualidade, porque não possui a materialidade da arte", diz.
Eder Santos comparece com seu vídeo "Europa em Cinco Minutos", uma colagem de imagens feitas amadoristicamente em viagem pela Europa e Estados Unidos, discutindo, na visão da curadora, a diminuição da capacidade de retenção e memória.


Exposição: Imagem em Movimento Onde: Casa das Rosas (av. Paulista, 37, Paraíso, tel. 0/xx/11/288-9447) Quando: abertura dia 7/12, às 19h. Ter. a dom.: das 12h às 20h. Até 19/12 Quanto: entrada franca


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