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INÉDITOS
O clássico "O Mensageiro", escrito pelo britânico Leslie Poles Hartley e adaptado para o cinema em 1971, ganha agora tradução para o português, 50 anos depois de sua publicação
Tempo estrangeiro
Leia abaixo um trecho do romance "O Mensageiro" ("The
Go-Between"), do britânico L.P.
Hartley (1895-1972). Publicado
em 1953, o livro foi adaptado para
o cinema pelo dramaturgo Harold Pinter e chegou às telas dirigido por Joseph Losey em 1971.
A carreira de sucesso do longa
conta com uma premiação no
Festival de Cannes de 1971, onde
levou o Grande Prêmio Internacional. No elenco, estão os atores
Alan Bates (que interpreta Ted
Burgess), Julie Christie (Marian),
Margaret Leighton (sra. Maudsley) e Michael Redgrave (Leo
Colston com mais de 60 anos).
Essa edição de "O Mensageiro",
que será lançada este mês pela
Nova Alexandria, é a primeira tradução da obra para o português.
Estavam todos ao chá quando
cheguei. Senti que havia estado
longe por meses, tão diferente era
a atmosfera e tão alheia a experiência pela qual passara. À visão
de meu joelho, eles se derramaram em condescendências e eu
contei-lhes como Ted Burgess havia sido gentil.
-Ah, o sujeito da fazenda
Black -disse o sr. Maudsley.
Grande sujeito, cavalga bem, ouvi
dizer.
-Ele é o homem que eu quero
ver -disse lorde Trimingham-
Espero que vá jogar na partida de
sábado. Quer dizer então que você teve uma conversa com ele.
Fiquei imaginando se Ted Burgess havia se metido em apuros;
olhei para Marian, esperando que
fizesse algum comentário, mas ela
parecia não ter ouvido: seu rosto
tinha o duro e aquilino aspecto
que mostrava às vezes. Eu podia
ouvir a carta farfalhando em meu
bolso e imaginava se alguém poderia notar. Subitamente, ela se
levantou e disse:
-Acho que é melhor eu cuidar
desse joelho para você, Leo. Está
parecendo um pouco sujo.
Contente por sair dali, eu a segui. Ela foi para o banheiro; era o
único, acho, em toda a casa. Nunca o havia visto antes: Marcus e eu
tínhamos uma tina para nos lavarmos em nosso quarto.
-Fique aqui -ela ordenou-,
vou procurar outra bandagem
para você.
Era um grande aposento com o
que me pareceu desnecessário,
um lavatório; mas por que as pessoas iriam querer uma banheira e
também um lavatório? A banheira era envolta em mogno e tinha
um tampo também de mogno.
Parecia uma tumba. Quando ela
voltou, ergueu o tampo e me fez
sentar na borda da banheira enquanto tirava meu sapato e minha
meia, como se não soubesse que
eu era velho o bastante para fazer
isso sozinho.
-Agora, ponha seu joelho sob
a torneira -disse.
A água escorria pela minha perna deliciosamente fresca.
-Meu Deus -disse ela-, você levou mesmo um tombo.
Mas, para minha surpresa, não
disse nada sobre Ted Burgess até
quase o final, depois de ter colocado a nova bandagem. A velha jazia na borda da banheira, toda
amarrotada e manchada de sangue; Marian olhou para ela e disse:
-Esse lenço é dele?
-Sim -falei. Ele disse que não
ia querê-lo de volta, então posso
jogá-lo fora? Sei onde fica o lixo
-Não era oficiosidade, queria
poupá-la do trabalho. E eu acolhia
com prazer a chance de voltar a
visitar o lixo, aquele grato toque
de imundície em toda a magnificência.
-Oh, talvez eu o lave -disse
ela-, parece ser um lenço muito
bom.
Então lembrei-me da carta, que
havia mantido esquecida, pois enquanto estava com Marian só
pensava nela.
-Ele me pediu para lhe entregar isso -falei, puxando a carta
do bolso. Parece que está bem
amassada.
Ela quase arrancou-a de minha
mão e depois olhou em torno procurando um lugar para pô-la.
-Oh, estes vestidos! Espere um
momento -disse, e desapareceu
levando consigo a carta e o lenço.
Um momento depois, voltou e
disse:
-Agora, que tal a bandagem?
-Mas você já colocou -falei,
mostrando meu joelho.
-Valha-me Deus, é mesmo.
Agora, vou calçar sua meia.
Protestei; mas não, ela própria
queria fazer isso e não pude dizer
que me incomodava.
-Há uma resposta para a carta? -perguntei, desapontado de
que ela a tivesse tomado tão ligeiramente. Mas ela apenas balançou a cabeça. -Você não deve falar a ninguém sobre essa... carta
-disse, desviando os olhos de
mim-; absolutamente ninguém,
nem mesmo Marcus.
Fiquei um tanto aborrecido
com tantas injunções por segredo. Os adultos pareciam não perceber que, para mim, assim como
para a maioria dos outros colegiais, era mais fácil manter silêncio do que falar. Eu era uma ostra
genuína. Assegurei a Marian novamente de que seu segredo estava bem seguro comigo. Com paciência, expliquei que de qualquer
maneira não poderia contar a
Marcus, porque ele estava de cama e eu não podia vê-lo.
-É claro que ele está -falou
ela-, parece que eu esqueço tudo. Mas você não deve soltar uma
palavra, eu ficaria terrivelmente
zangada com você se o fizesse.
Então, vendo que eu parecia
muito magoado e a ponto de chorar, enterneceu-se e disse:
-Oh, não, eu não ficaria, mas
veja que isso colocaria nós todos
no mais terrível apuro.
A OBRA
"O Mensageiro"
Autor: L.P. Hartley
Tradutor: Paulo Cezar de Mello
Editora: Nova Alexandria
Quanto: R$ 33 (248 págs.)
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