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RECEITAS DO MELLÃO
A anta de Raimundópolis
HAMILTON MELLÃO JUNIOR
Colunista da Folha
Acabo de passar dez dias dividindo o pão da intimidade
com amigos, no Piauí. Pão,
não, que em Raimundópolis
não tem padaria. Era pão tipo
americano, marca Seven Boys.
Aliás, coisas supérfluas como
alho, farinha de trigo e manteiga fresca não são encontradas
no comércio local. Os dois armazéns possuem, até com certa abundância, o essencial: chocolate Prestígio, Danoninho e
sucrilhos...
Desde que desci do ônibus na
rodoviária, o que eu mais tenho
escutado é: "Que cazzo você foi
fazer em Raimundópolis?".
Não, não era a descoberta de
uma cidade perdida nem o resgate etnológico de uma tribo
desconhecida.
Fui até lá com um antiquário
famoso, com jeitão de duque
inglês, para visitar a cidade onde ele foi concebido, nasceu e
se criou e de quem não posso
declinar o nome, para não
comprometer sua persona social .
Estava também conosco o intrépido Holanda, grande fotógrafo de gastronomia que, logo
na chegada, estremeceu a cidade dando um tiro de cartucheira numa anta. Não numa anta
qualquer, mas na de estimação
dos 650 habitantes, que vivia
cevada como atração na praça
da cidade.
Na mesma noite, foi feito o
velório da anta e, no dia seguinte, um consternado enterro no
cemitério local. Salvou-nos da
provável vingança dos munícipes uma providencial polaroid
-na qual retratamos todos
eles durante o féretro.
Com as fotografias, conseguimos também, por escambo,
frutas novidadeiras, como sorva, araticum, sapota e pindaíba
que, com os banhos de rio, refrescaram o nosso escaldante
reconhecimento tropical.
De resto, voltei com outra
cor, bem queimado. Agora sinto que tenho, realmente, um pé
na cozinha.
E-mail: mellão@uol.com.br
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