São Paulo, #!L#Sexta-feira, 04 de Fevereiro de 2000


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O ROTEIRISTA
"Você pode extirpar problemas profundos vendo sua fantasia"

MICHEL KAPLAN
do "The New York Times"

O diretor e roteirista Paul Schrader, cujo último trabalho foi com Martin Scorsese em "Vivendo no Limite" ("Bringing Out the Dead"), fala sobre o efeito terapêutico de uma boa história de personagens obscuros e sem qualquer esperança.

Pergunta - Seu roteiro para "Vivendo no Limite" ("Bringing Out the Dead"), sobre um paramédico desequilibrado, não mudará sua imagem (lembrando "Taxi Driver") de escritor obscuro. O que o leva a esses personagens?
Paul Schrader -
Eles não são obscuros. Obscuro é uma palavra-código em Hollywood para não-comercial. Sempre fui interessado em pessoas inteligentes, que parecem ter algum interesse na vida, mas segue rodeando, agindo como se defendendo porque expressam algum tipo de neurose, seja sexual ou espiritual. O rapaz que salva o avião do presidente de terroristas não é muito interessante para um artista.

Pergunta - Seu próximo filme, "Forever Mine", é uma história mais melodramática. Sua aversão a essas coisas serviram contra você em Hollywood?
Schrader -
Claro. O objetivo de qualquer artista -alguém disse e eu aceito- é tentar vender para falhar. Nessa medida, eu me dei muito bem. Mas algumas vezes o produto não vale o tempo e o esforço. Scorsese e eu enveredamos por "Vivendo no Limite". No último minuto, recebemos notas do produtor tentando simplificar o conflito do personagem principal para uma situação passível de uma solução. Mas a vida nos dá dilemas que nunca são resolvidos. Scorsese e eu respondemos dizendo que (...) ele vê o personagem como instrumento de elucidação, e nós, como elemento de mistério.

Pergunta - Há algo em sua própria experiência que o leva a esses personagens e dilemas?
Schrader -
Apenas o sentido de tentar se adequar a um ambiente hostil, espiritualmente vazio. Passei meus primeiros 22 anos numa comunidade religiosa fechada, indo à escola da igreja.

Pergunta - Escrever é uma busca pela ordem e pela razão?
Schrader -
Certamente, para mim. Comecei a escrever roteiros como uma terapia pessoal.

Pergunta - Importa-se de dizer qual era o problema?
Schrader -
Ódio suicida de mim mesmo. Não como Travis Bickle. Meu casamento acabou. Assim como o relacionamento. Caí no desespero. Tive uma úlcera e, conversando com a enfermeira, descobri que não tinha falado com ninguém por três semanas. No hospital, a metáfora do motorista de táxi me ocorreu.

Pergunta - Qual a atração do público por essas histórias?
Schrader -
Esses tipos de protagonistas, ao longo da história da arte, têm ajudado a manter a tensão social coletiva. A idéia é que você pode extirpar certos problemas profundos, ansiedades, conflitos, vendo a sua fantasia.


Tradução Rogério Eduardo Alves

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