|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LIVROS
ANTOLOGIA
Sai o primeiro volume da coleção que reunirá o melhor da publicação, com organização de Sérgio Augusto e Jaguar
O melhor do "Pasquim" ainda continua bom
MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DA ILUSTRADA
Contrariando uma das muitas e
boas tiradas aforismáticas do jornalista Ivan Lessa, segundo a qual
"a cada 15 anos os brasileiros esquecem o que aconteceu nos últimos 15 anos", a lenda do "Pasquim" permanece viva, já passados quase 37 anos da fundação do
jornal. É possível que as "voltas"
do hebdomadário, à maneira de
algumas velhas bandas de rock,
tenham ajudado a manter o título
em circulação -mas provavelmente também contribuíram para diminuir sua força.
O fato é que nos círculos onde
esse tipo de informação importa,
mesmo quem não leu ou não era
nascido à época sabe que na virada da década de 1960 para a de
1970 surgiu no Rio um jornal independente em cujas páginas desfilavam alguns dos mais talentosos cartunistas, jornalistas, artistas e intelectuais do país.
Agora, chega às livrarias o primeiro volume de um conjunto de
três ou quatro livros que reunirá o
"best of" do "Pasquim". Organizada pelo jornalista Sérgio Augusto e pelo humorista Jaguar, fundador do jornal, a antologia começa
com os primeiros 150 números,
editados de 1969 a 1971.
"O critério de escolha foi altamente subjetivo", diz Sérgio Augusto, que começou a escrever para o "Pasquim" poucas semanas
depois do lançamento, e posteriormente veio a dirigi-lo.
"Embora alguns artigos e entrevistas tenham ficado envelhecidos, com referências e brincadeiras circunstanciais, nos deparamos com uma quantidade muito
grande de coisas boas. Tanto que
a idéia era fazer uma seleção dos
primeiros 200 números, mas acabamos ficando só com 150", diz.
O conteúdo do livro realmente
não diminui a lenda. Inteligente,
bem-humorado, anárquico, o
"Pasquim" logo conquistou a
simpatia de artistas e intelectuais.
Além da produção de sua equipe
(ou "patota", como diziam), formada por nomes como Paulo
Francis, Tarso de Castro, Millôr
Fernandes, Ziraldo, Ivan Lessa e
Luiz Carlos Maciel, muitos representantes da intelectualidade e do
meio artístico colaboravam com o
"Pasca" -entre eles, Vinicius de
Morais, Caetano Veloso, Chico
Buarque, Glauber Rocha, Dalton
Trevisan, Antonio Callado, Rubem Fonseca, Flávio Rangel e
Carlos Heitor Cony.
Não é preciso esforço de adaptação mental ao contexto da época para aproveitar a leitura. Vários artigos tratam de temas universais ou de assuntos que ainda
despertam interesse. Francis, por
exemplo, estréia com um texto
sobre o Marquês de Sade. Rubem
Fonseca disserta sobre a pornografia. Vinicius escreve sobre mulheres ou traça perfis de personagens como Dorival Caymmi.
Entrevistas
Mas também o sabor de época é
curioso e sedutor, presente, entre
outras páginas, nos cartuns excepcionais de Henfil e Jaguar, nos
textos de Caetano Veloso e Chico
enviados da Europa ou nas intervenções de Glauber Rocha. Uma
delas, a propósito, merece o epíteto de "histórica": uma entrevista
do cineasta com o escritor Gabriel
García Márquez, publicada no
início de 1971. Cheia de humor e
sarcasmo, a conversa transcorre
no momento em que Gabo estourava com "Cem Anos de Solidão".
Ele, que passara anos fazendo argumentos para filmes mexicanos
vagabundos, declara: "Tive ódio
do cinema. Achei que devia fazer
um livro genial, ficar rico e abandonar de vez os países subdesenvolvidos".
Capítulo à parte são as entrevistas. Ficaram famosas por serem
feitas em grupo, regadas a uísque
e editadas em registro coloquial.
Jaguar garante que a fórmula surgiu ao acaso, por ele não saber copidescar -ou adaptar o texto a
um padrão jornalístico. Bem, vamos acreditar.
Uma das mais famosas, a da
atriz Leila Diniz, exemplifica muito bem o espírito da coisa. Além
dos palavrões (substituídos por
asteriscos), as perguntas não
eram exatamente convencionais.
Basta citar que a dada altura alguém pergunta: "Você deu para o
seu analista?".
O Pasquim - Antologia 1969-1971
Organização: Sérgio Augusto e Jaguar
Editora: Desiderata
Quanto: R$ 69 (352 págs.)
Texto Anterior: Vitrine Brasileira Próximo Texto: Tablóide teve influência sobre o jornalismo Índice
|