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MÚSICA ERUDITA
Violoncelista radicado na Suíça se apresenta com instrumento Matteo Goffriller, de 1700, e faz quatro récitas
Meneses leva três séculos à Sala São Paulo
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
O violoncelista brasileiro Antonio Meneses, 44, dará hoje a primeira das quatro récitas que programou para a Sala São Paulo.
Hoje e sábado ele será o primeiro violoncelo do Sexteto de Cordas da Osesp (Orquestra Sinfônica do Estado), que interpretará
peças de Brahms ("Sexteto nš 1",
op.18) e Tchaikovski ("Souvenirs
de Florence", op. 70).
Na semana que vem, como solista e sob a direção de John Neschling, fará com a sinfônica o
"Choro para Violoncelo e Orquestra", de Camargo Guarnieri.
Meneses, radicado na Suíça, é o
violoncelista do Trio Beaux Arts,
prestigiosa formação de câmara
dos Estados Unidos.
Ele se apresenta em São Paulo
com um instrumento Matteo
Goffriller, de 1700.
Eis os principais trechos de sua
entrevista à Folha.
Folha - O sr. interpretou com a
Osesp há dois anos "Fantasia", de
Villa-Lobos. E fará, na semana que
vem, o "Choro", de Camargo Guarnieri. Esse repertório brasileiro não
vem sendo menosprezado?
Antonio Meneses - Não só menosprezado, como também desconhecido. No Brasil quase não se
tocam essas obras e no resto do
mundo menos ainda. Creio que
está na hora de começarmos a
apresentar esse repertório para
um público que o desconhece.
Folha - Esse desconhecimento se
deve à falta de edição, à falta de
violoncelistas, à falta de orquestras ou às três coisas combinadas?
Meneses - Pode ser tudo isso e
algumas outras coisas também.
Não é por falta de violoncelistas.
Há muitos, mas eles não sabem
que essas obras existem. Um músico que queira mergulhar no desconhecido geralmente opta por
uma estréia mundial. É para ele
mais interessante, ele atrai mais a
crítica. Por isso, peças escritas há
50 anos começam a cair no esquecimento.
Folha - O público gosta da sonoridade, das suites de Bach, dos concertos de Haydn ou de Dvorak. Mas
há muitas peças brasileiras para
violoncelo no século 20.
Meneses - Qualquer músico normalmente se apresenta em primeiro lugar com o repertório tradicional. Foi o meu caso. A experimentação do desconhecido vem
depois. A peça do Guarnieri programada para a semana que vem,
eu nunca a toquei. Estamos sempre ocupados com as obras consideradas como as mais valiosas em
termos mundiais. Esquecemos
das pérolas escondidas.
Folha - Os sextetos de Brahms e
de Tchaikovski que serão interpretados hoje foram sugestões suas?
Meneses - Sim. São peças em que
o primeiro violoncelo tem uma
função quase tão importante
quanto à do primeiro violino.
Folha - Qual o critério da escolha?
Meneses - Eu sempre tive vontade de tocar esse Tchaikovski. Jamais o interpretei. Para contrastar
com ele eu pensei no Brahms, o
que criaria um contraste muito
grande entre as duas obras no
programa. O Brahms é muito
mais poético, introspectivo, enquanto o Tchaikovski já é extrovertido, "para fora".
Folha - O "Sexteto nš 1" de
Brahms é quase metafísica, não é?
Meneses -Esse sexteto é muito
redondo, muito íntimo. A maneira de descrever que ele tem não é
baseada em opções mais fáceis,
mais baratas. Tchaikovski, ao
contrário, utiliza-se de todos os
truques possíveis.
Folha - A gravação que o sr. fez
das suítes de Bach estão disponíveis apenas no Japão. Há limitações parecidas quanto às integrais
para violoncelo e orquestra de Villa-Lobos?
Meneses - Essa última gravação
foi distribuída mundialmente por
uma gravadora francesa. São os
dois concertos e mais a "Fantasia", com a Sinfônica da Galícia,
cujo regente é o Pablo Juan Perez.
Folha - Como funciona sua programação com o Trio Beaux Arts?
Meneses - Temos geralmente
quatro turnês espalhadas pelo
ano. Em outubro, fazemos uma
pela Europa, outra pelos Estados
Unidos. Em janeiro ou fevereiro,
mais uma pela Europa, mais outra pelos Estados Unidos. E algumas vezes fazemos em agosto
concertos de verão.
Folha - Sua agenda este ano o levará novamente a locais distantes
como a Austrália?
Meneses - Estivemos na Austrália e em toda a Ásia há dois anos.
O Beaux Arts se apresentou até no
Vietnã. Mas desta vez, ao menos
para mim, o mais longe que irei
será mesmo o Brasil.
Folha - Há algum CD seu para ser
lançado?
Meneses - Sim. Há as obras de
Villa-Lobos de violoncelo com
piano e que eu gravei com a Cristina Ortiz. Deveremos fazer proximamente um recital de lançamento, no Rio. E há também um
CD em que reuni peças curtas, interpretadas como bis.
Folha - Haveria hoje o crescimento da prática do violoncelo como
ocorreu, nos anos 70, um "boom"
que favoreceu o piano?
Meneses - Há um crescimento
do interesse pelo violoncelo desde
o começo do século 20, embora
seja mais lento do que ocorre com
o piano, porque o repertório de
piano é tão vasto e bonito, que é
difícil competir.
Folha - Até que ponto o "efeito
Casals e Rostropovich", ou seja, a
imensa popularidade desses dois
intérpretes, também não influiu?
Meneses - É uma maneira de ver
a coisa que pode ser correta.
Folha - Mas há influência no repertório, com peças compostas para eles.
Meneses - É sobretudo o caso de
Rostropovich, que estimulou as
composições. Casals, ao contrário, não fez muito pela música
moderna. Ele foi uma pessoa
muito conservadora. Debussy para ele não era mais música. A música para ele cessava com Brahms.
ANTONIO MENEZES E A OSESP
Quando: hoje, às 21h, e sábados, às
16h30, Sexteto de Cordas da Osesp; dia
11, às 21h, e dia 13, às 16h30, além do
Guarnieri solado por Meneses, a
orquestra faz a "Sinfonia nš 7", de Haydn,
e "Don Quixote", de Richard Strauss.
Onde: Sala São Paulo (pça. Júlio Prestes,
s/nš, tel. 0/ xx/ 11/ 3337-5414). Quanto:
R$ 12 a R$ 36.
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