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LIVROS
Crítica/"Os Exilados de Montparnasse"
Autor narra "desterro cultural" de artistas que adotaram Paris
Francês aborda disputas, amores e rancores de integrantes da "geração perdida"
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
As hordas de turistas que
hoje ocupam as calçadas da capital francesa
estão sempre em busca de algo
que, se Paris um dia teve, já faz
tempo que perdeu nas brumas
da globalização. O que a cidade
viu crescer e se reproduzir nos
últimos séculos foi toda uma
mitologia da liberdade, nascida
sob o vendaval da Revolução
Francesa e hoje convertida ao
"prêt-à-porter" das artes, das
modas e do que mais for preciso
para se sentir "único".
Um dos momentos mais
marcantes da fase madura desse mito aconteceu ao longo dos
anos 20, quando Paris exalava
um perfume de libertinagem,
tanto comportamental como
artística. Foi isso que atraiu para lá centenas de imigrantes,
provisórios ou não, vindos dos
quatro cantos de uma Europa
destroçada pela Primeira Guerra, e sobretudo dos EUA íntegros e puritanos. É a essa encantadora forma de desterro
que o escritor francês Jean-Paul Caracalla se dedica a detalhar o comportamento em "Os
Exilados de Montparnasse".
Atraídos pela fama de liberdade, pelos encantos de uma
boemia supostamente capaz de
aditivar quaisquer ideais de
ruptura na criação (o modernismo está a pleno vapor, é bom
lembrar) e, sempre importante,
por uma taxa de câmbio vantajosíssima (US$ 1 equivalia a 55
francos), os americanos lideravam a colônia de "exilados".
Reuniram-se no "The Quarter", nome que a colônia anglo-americana se referia à área de
Montparnasse. "Residência das
Musas na Grécia Antiga, aquele
"mont Parnasse", monte Parnaso, se torna para eles o Olimpo,
um ponto de encontro internacional dos poetas, escritores,
pintores e suas excêntricas inspiradoras", esclarece Caracalla
sempre com uma suave ironia.
Dois pontos cardeais ajudarão os exilados a se orientarem
no dédalo daquela capital da
modernidade: o nº 27 da rue de
Fleurus e o 12 da rue de l'Odéon. O primeiro abrigava a
moradia-ateliê onde a pioneira
Gertrude Stein e seu irmão Leo
traduziam para os recém-chegados qualquer novo sinal de
ruptura. O outro foi o encontrado por Sylvia Beach para instalar a Shakespeare & Co, mítica
livraria que, além de abrigar
publicações censuradas do outro lado da Mancha e do Atlântico, aventurou-se na edição e
fez história ao publicar o "Ulisses", de James Joyce, em 1922.
"Geração perdida"
As disputas, os amores e os
rancores dos mais ilustres integrantes dessa "geração perdida", como Gertrude Stein designou aquele grupo de identidade vacilante, tornam a leitura do livro uma delícia. Caracalla recorre, é claro, a um tanto
de fofoca ou apimenta com
maldades os relatos que, de outra forma, poderiam resultar
em enfadonhas reconstituições
de detalhes biográficos.
Mas, se até a vida dos deuses
do Olimpo original tiveram direito a certos detalhes de menor grandeza, por que esses
ídolos do século passado também não teriam?
OS EXILADOS DE
MONTPARNASSE
Autor: Jean-Paul Caracalla
Tradução: Véra Lucia dos Reis
Editora: Record
Quanto: R$ 40 (294 págs.)
Avaliação: bom
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