São Paulo, sexta-feira, 04 de maio de 2007

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Crítica/"Marcas da Vida"

Ao ocultar informações, filme sobre voyeur não consegue criar clima de tensão

INÁCIO ARAUJO
CRÍTICO DA FOLHA

No início estamos em "Janela Indiscreta". Jackie (Kate Dickie) dedica-se ao voyeurismo profissional, controlando a movimentação dos habitantes de Red Road, que podemos presumir ser um local meio barra-pesada de Glasgow, Escócia. Ela é da polícia. Logo estamos num drama corrente: o da mulher sem ligações afetivas (de tempos em tempos tem uma transa horrível com um cara que passa de carro) e familiares (não se dá com a família do marido).
A pergunta que o espectador é convidado a fazer é: quem é Jackie? O filme de Andrea Arnold não desmente a pergunta: é feito de planos curtos (desses que jogam a responsabilidade do resultado na mão do montador) e aproximados no rosto da mulher. Ela é um enigma.
Até aí a coisa está bem colocada. Mas a arte da escansão é traiçoeira: quando entrar com determinado plano, com certa informação? Eis onde escorrega dolorosamente o filme. Em dado momento, ela vê nas câmeras um criminoso que acaba de ser solto. O fato a toca. Por quê? Não sabemos. Mas ela se dedicará obsessivamente a ele. Pensamos entrar no registro de "Matar ou Morrer", do policial que teme a liberdade do bandido que prendeu. Poderia render algo, em se tratando de uma mulher. É uma falsa pista.
Daqui por diante, é preciso omitir o que acontece para não revelar o que o filme esconde. Mas pode-se afirmar que esse ocultamento é lamentável -faz o espectador seguir os movimentos da mulher por minutos e minutos sem entender o sentido deles. Falta informação capaz de, na hora devida, alimentar a dramaticidade do filme e a curiosidade do espectador.
Quando os dados são revelados, já não servem a montar um quebra-cabeça. Parecem arbitrários e pouco significativos. Constata-se que aqueles que conhecemos pouco tendem a ser diferentes se vistos de perto. Mas disso já sabíamos.


MARCAS DA VIDA
Direção:
Andrea Arnold
Produção: Inglaterra, Dinamarca, 2006
Com: Kate Dickie, Tony Curran
Quando: estréia hoje nos cines TAM, Reserva Cultural e Sala UOL
Avaliação: regular


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