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MÚSICA ERUDITA
Lipatti resgata as figuras do mito e do herói
WILLIAM LI
especial para a Folha
O nome de Dinu Lipatti evoca
uma era distante na arte de interpretação pianística e a figura de
um mito e um herói. Nascido na
Romênia em 1917, Lipatti iniciou
sua carreira aos 4 anos como menino prodígio.
De saúde muito frágil, frequentou o Conservatório de Bucareste
com uma dispensa especial, ao
mesmo tempo que recebia em casa
a instrução regular. Em 1933, obteve o segundo lugar no Concurso
Internacional de Viena, o que provocou a ira de Alfred Cortot, presidente da banca, que não concordava com essa colocação.
Retirando-se do júri, Cortot convidou Lipatti a estudar com ele na
"École Normale de Musique" de
Paris, onde este pôde travar contato também com Charles Munch,
Paul Dukas, Nadia Boulanger e
François Poulenc, tornando-se assim um dos maiores expoentes da
escola francesa.
Sua carreira de concertista foi interrompida pela guerra e por sua
saúde precária, mas desde cedo Lipatti procurou deixar registradas
em gravações suas inovadoras
concepções com relação aos maiores compositores pianísticos.
A Philips e a EMI lançam agora
num álbum duplo uma compilação das principais gravações de Dinu Lipatti, na qual podem ser reavaliadas sua fama e seu pioneirismo. As remasterizações contidas
nesses CDs cobrem o período que
vai de 1937 até 1950, ano de sua
morte, e abrangem o essencial do
repertório pianístico, desde Bach
até Ravel.
Lipatti ganhou notoriedade principalmente por suas interpretações dos românticos, especialmente Chopin e Schumann. Como um
expoente da Escola de Paris, Lipatti esteve sempre atento aos recursos expressivos e sonoros que cada
partitura lhe propunha e procurou
recriá-las segundo sua formação
"impressionista".
Vale conferir sua interpretação
do "Concerto em lá menor op. 54",
de Schumann, considerada insuperável por muitos, assim como a
da "Sonata em si menor op. 58",
onde Lipatti nos revela um Chopin
enérgico, criativo, que foge do óbvio e cheio de efeitos sonoros.
A interpretação da "Partita em si
bemol BWV 825", de Bach, coloca
Lipatti como um precursor de
Glenn Gould: extremamente contrapontística, ela surpreende-nos
ainda hoje pelo uso criterioso do
"legato" e do "staccato" e pelo jogo
entre as vozes.
Mas é em Mozart que Lipatti
afasta-se mais dos padrões atuais,
ao conceber a sonata para piano de
maneira orquestral. Ao contrário
das interpretações "históricas" de
hoje, Lipatti transfigura a sonata e
redescobre nela a personalidade
mais profunda de Mozart. Sua execução é apaixonada e cheia de matizes, rica em variações timbrísticas e dinâmicas.
Constam também do álbum gravações de Ravel, Grieg, Schubert e
Brahms. Em todas elas, encontramos o mesmo cuidado na exata
abordagem das intenções do compositor, sem abrir mão de explorar
todos os recursos que o moderno
piano de concerto lhe oferece.
As lições que Lipatti deixou para
a sua geração e as posteriores foram muitas e duradouras. A principal delas é a preocupação por estabelecer uma verdade musical
que esteja além dos modismos e limites de uma época, o que faz a
glória de Dinu Lipatti até hoje.
Avaliação:
Disco: Dinu Lipatti, na série Great Pianists of
the 20th Century (2 CDs)
Lançamento: Philips/EMI
Quanto: R$ 40 (em média)
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